Hoje de manhã, alguém retweetou um comentário de Felipe Moura Brasil (@BlogDoPim) que chamou minha atenção.
"Como escrevi em abril de 2014 (e alguns comentaristas insistem em provar): 'A ironia no Brasil precisa de prefácio explicativo."
Não sei a que se referia especificamente - imagino que seja alguma crítica ao PT ante a conhecida posição do autor do tweet. No entanto, achei o comentário sobre a ironia pertinente.
Sou muito apegada à língua portuguesa. Acho que foi meu pai que me passou tal zelo. Cresci com extrema preocupação de usar bem o vocabulário adquirido, deixando as palavras mais informais para os ambientes informais e as formais para onde caberiam.
Obviamente cometo erros. Diariamente. Nossa língua revela-se um saboroso mistério a cada dia. Só para ilustrar, descobri numa reportagem que "mussarela" não se gravava assim, mas "muçarela". Um choque ainda sendo digerido.
Lembro que estava na luta para obter título de Especialista em Direito Constitucional junto à UFRN, quando tive uma aula sobre a dissertação da monografia final. Dentre muitas coisas interessantes, uma ficou em minha memória. Segundo a professora, não há necessidade de colocar um termo aplicado com ironia ou com outro sentido entre aspas. Quem ler o texto terá capacidade de entender que o termo foi aplicado de outra forma. Por exemplo, se eu digo que fulano voou até uma sala, não preciso colocar "voou" entre aspas porque todo mundo é capaz de compreender que o termo foi usado com outro sentido, já que não é dado ao ser humano voar sem ajuda de equipamentos.
Levo essa lição comigo. Não ponho mais aspas quando uso termos com sentido diverso do original. Mas a percepção de que a compreensão de leitura anda em baixa no Brasil é desanimadora. Primeiro, porque ler nunca foi prioridade da maioria dos brasileiros. Segundo, porque português também nunca foi a matéria predileta dos brasileiros na escola. Terceiro, talvez este seja até o motivo fundamental, porque quase ninguém mais se dá ao trabalho de ler algo com mais de 140 caracteres com a devida atenção.
Assim, morre a comunicação e, por tabela, morre a ironia. Como expor sarcasticamente uma opinião sem que algum descuidado compreenda exatamente o contrário? A fina ironia é recurso que torna um texto agradável, posto que usa um humor inteligente para expor uma crítica. Perde-se a graça se precisamos explicar didaticamente a ironia.
Ressalte-se que nem só de ironia podemos viver. Quem só se comunica irônica ou sarcasticamente passa um menosprezo grande aos interlocutores. Termina por não ser bem compreendido quando enfim não esteja sendo irônico ou sarcástico. Vira um chato de galocha.
Por um mundo com ironias na dose certa e bem compreendidas. Sem prefácio explicativo.
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