domingo, 24 de abril de 2016

Simone e os flashes

Ingressos a R$ 0,50 e R$ 1 foram rapidamente pulverizados. Eu mesma só pude ir ao show porque minha irmã conseguiu comprar para mim. Teatro Riachuelo bem cheio. 

Antes dos shows os anúncios habituais. Um se destaca: não é permitido usar flash nas fotos. Foi o único anúncio com direito a bis.

Assim que o show começa entendemos porquê. Simone passa a levantar as mãos para impedir a chegada da luz dos flashes até ela. Faz gestos para a retirada como quem espanta uma mosca. Também com gestos, manda um rapaz da produção ir até lá na plateia para resolver o problema.

Tive pena do rapaz. Ele é uma espécie de tradutor dos pequenos chiliques de Simone no palco. Seu semblante é de eterna tensão. Vive de olho na cantora, na plateia e até nos engenheiros de som porque a cantora também reclama dos ajustes durante o andamento do show.


A voz de Simone é indiscutível, conforme vídeo acima. O show tem cenário de muito bom gosto. Os músicos são de primeira. Mas o clima de tensão me incomodou. 

Logo no "boa noite" ela falou que tinha um problema no olho direito que incomodava muito ao receber a luz de flashes. Falou da alegria em voltar a Natal. Tentou ser simpática, apesar dos estresses. 

Algumas pessoas insistiam nas fotos com flash. Simone então interrompeu uma música logo no início, tirou o microfone do pedestal e dirigiu-se até a criatura para passar uma lição de moral: "Acho que você não conseguiu compreender. Tem uma coisa aí 'sem flash'. É aí que você coloca, tá?" Nesse momento eu pensei: "Vai ter que desenhar".

Janaina, que adora uma palhaçada, não resistiu. Assim que os holofotes do palco se fixavam em nossa direção, o que nos encandeava e também me incomodava muito porque tenho fotofobia, ela repetia os gestos da cantora, como se estivesse afastando mosquitos. Pronto, risadas nos assentos próximos.

Sobre o show em si, achei a voz de Simone muito alta, incomodando mesmo. Um volume de som mais baixo seria recomendável. Algumas músicas são bem chatinhas e nem deveriam estar no repertório de uma cantora que já tem 43 anos de carreira e pode cantar só músicas que fazem parte de sua discografia. Mas era a proposta do show. E Simone tem essa mania de desacelerar alguns sucessos para fazer uma interpretação melancólica. É uma grande intérprete, e, portanto, isso me parece um floreio desnecessário. Só para ilustrar, ela fez isso num ótimo CD gravado ao vivo com um sambinha de Martinho da Vila chamado Mulheres. Ficou chato pra dedéu. 

Outra coisa que acho horrível, mas não é exclusivo de Simone, e sim uma praga dos cantores e bandas brasileiros: o tal do bis. Antigamente, essa volta ao palco era algo fora da pauta, surpreendente, que acontecia quando o clima do show era alucinante e, ao encerramento, a galera não arredava pé pedindo a volta do artista. Em algum momento, virou clichê: os artistas interrompem o show mais cedo só para terem seu ego massageado com os pedidos de bis. É tudo absolutamente programado. Eu vou achar uma beleza o dia em que todo mundo se levantar e for embora deixando os artistas sem cantar seus maiores sucessos, sempre guardados como coringas para o bis, e acabando com essa presepada tupiniquim. No show cover de ABBA, algumas pessoas (poucas) se levantaram para ir embora. E isso se repetiu no show de Simone. O bis pode esperar que a sua hora vai chegar.

Acho uma pena que cantores de grande talento se deixem virar caricaturas ranzinzas no palco. Se a preocupação com a parte técnica, por exemplo, é mesmo tão grande, por que não passam o som antes, como Madonna faz mesmo em shows em dias seguidos? O ajuste de ontem pode não se manter para hoje. Outra coisa, shows patrocinados com ingressos populares tendem a ser a última Coca-cola no deserto em relação ao requinte. Dinheiro não falta porque não há a limitação de depender apenas do que pode ser arrecadado com a bilheteria. Então não dá para ficar reclamando do piano na hora do show. Isso sempre me passa uma sensação de falta de profissionalismo.

No fim, Simone voltou ao palco para cantar uma música e distribuir rosas brancas à plateia. Demonstrou bom humor ao tentar mandar uma delas para uma fã nas frisas, alto para o arremesso de uma coisa tão leve, mas um pequeno detalhe para quem já jogou basquete. Na 3.a ou 4.a tentativa, a rosa chegou lá - muitos aplausos em comemoração.

Eu fiquei na dúvida se gostei ou não do show. Se tirássemos a tensão que mencione e o momento de melancolia, certamente eu teria saído de lá em êxtase. 

Talvez eu é que esteja virando uma caricatura ranzinza como espectadora...

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