quarta-feira, 4 de agosto de 2021

He-Man, redes sociais e o ouro de Ana Marcela

Ontem 3 acontecimentos diferentes me despertaram para a necessidade de encontrar um tempinho de vez em quando para organizar minhas ideias por aqui. Por incrível que pareça, o primeiro deles foi proporcionado por uma série animada - Masters of the Universe: Revelation, ou popularmente He-Man - que me levou de volta aos anos 80 e, de quebra, um dos personagens mais queridos - Orko, que aqui chamávamos Gorpo - me despertou de vez da letargia rumo à nostalgia.

No episódio, um já envelhecido e fraco Orko ressalta a importância de escrever sobre as pequenas coisas da vida, aquelas que parecem menores, mas que no fim, são as que mais nos remetem para os bons momentos que vivemos porque a nossa memória é falha, especialmente quando caminhamos rumo ao ocaso.

Sempre fui adepta de diários. Escrevia para mim mesma. Em algum momento entre o fim cronológico da adolescência e o início da idade adulta o hábito foi se perdendo. Retomei na internet a escrita sobre futebol, depois sobre outros temas. Até comprei um caderninho de notas que está sempre dentro da bolsa para qualquer emergência, mas ele vive mais tranquilo do que deveria.

O segundo acontecimento de ontem foi o triste episódio de um adolescente que se matou pela péssima repercussão de um vídeo pessoal publicado no Tiktok. Minha memória, que anda falha, ainda retém sentimentos importantes da infância e da adolescência. Desta última, lembro da luta que é não se sentir no lugar certo. Nem se é criança, nem se é adulto. Pertencer a grupos é importante, mas o senso de individualidade também é ressaltado. Toda pessoa adolescente quer aceitação, mas não quer ser como todo mundo. Ao mesmo tempo, também não quer romper a barreira de pertencer a determinado grupo. Daí que quase ninguém tem coragem de se vestir diferente do rebanho, por exemplo. 

Atualmente, ainda é preciso lidar com as redes sociais. Bullying ganhou uma outra dimensão. Julga-se tudo e todas as pessoas o tempo todo. Há uma carência de aceitação, agora potencializada na velocidade dos algoritmos. Quantas pessoas têm a noção de que há sentimentos por trás das telas? Que o que não se diz pessoalmente não se deve dizer virtualmente? Certamente uma pressão inimaginável para a minha geração e as que vieram antes recai hoje nas novas gerações. Afinal, se pessoas adultas sofrem com o conteúdo das redes, seja ele de uma felicidade perfeita, irreal, seja ele de um ódio sem limites, como reagem aquelas pessoas entre infância e adolescência que acham que esse mundinho é definitivo? 

Sei que não dá para simplesmente abandonar esse mundo que cada vez mais engloba o que vivemos. Quase tudo hoje se resolve online. Sobre as redes sociais especificamente, tento fazer minha parte. Além de denunciar conteúdos absolutamente destrutivos, que transbordam as críticas normais da vida em uma sociedade democrática, tento publicar pequenas realidades do meu dia a dia, bem longe do glamour que impera normalmente. É uma foto do chinelo que não aguentou o tranco, ou uma selfie toda descabelada, ou do churrasco em que não cabe mais picanha, ou do furo da dieta que deveria passar longe de açúcar, ou saudades de uma bela farofada (termo inventado por aqui para algo que o mundo inteiro tido como civilizado, como EUA e Europa, faz sem qualquer constrangimento e que aqui dizem que deveria ser motivo de vergonha) em Ponta Negra. A vida não é perfeita como mostram as postagens de Instagram e Facebook, principalmente. Ela é perfeita em sua imperfeição, em seus percalços. A felicidade é também formada de muitos contratempos e choros. Ninguém é feliz para sempre se tomarmos o conceito de felicidade como algo absolutamente livre de furos, imperfeições. A vida não é assim. Felicidade não é assim. Entender isso é libertador.

A terceira e última coisa foi a conquista de Ana Marcela na Olimpíada de Tóquio. Foi ouro quando todo o histórico apontava fracasso. Ontem, esqueceu o histórico e viveu o momento. Grande segredo da vida está em viver o momento. O meu momento com Ana Marcela, por exemplo, foi dúbio. Torci demais, me estressei demais, fui feliz demais, mas como sofro de cefaleia tensional, tudo isso me deixou com uma dor de cabeça desde o fim da prova dela ontem até esta manhã de quarta-feira. Não posso reclamar. Assim é a vida. Viver todas as suas emoções sempre cobrará um preço. Melhor exemplo para os percalços da felicidade não há. Feliz de quem entende.

2 comentários:

  1. Um texto como esse seu deveria ser leitura obrigatória, perfeito de ponto a ponto.

    Felizmente eu já entendi tudo isso a muito tempo, minha rede social é o WhatsApp e "curiar" o Twitter sem nem ter conta, valorizo a família (família mesmo, não parentes), a saúde, o momento, a simplicidade, a boa comida na mesa, o essencial.

    Peço a Deus que caia a ficha de mais e mais pessoas à se desconectar das redes e se conectar com o mundo real, que não é perfeito, mas é real!

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