quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Esfacelando-se

É certo que o povo brasileiro não andava nada satisfeito com a situação do país. Crise financeira,  crise ética, crise até existencial. Daí à eleição de um "anti" - aquele que é contra tudo que está aí - era um pulo. Afinal, é fácil de se identificar com o discurso do "anti". Desemprego? "Sou contra". Corrupção? "Sou contra". Criminalidade? "Sou contra". Junte-se a isso um discurso saudosista (ah, a memória que só se agarra aos bons momentos e apaga os ruins...) e está pronta a receita do retrocesso.

Temos 10 dias de governo Bolsonaro. São 10 dias de desencontros, disse-me-disse e voltar atrás no que fora anunciado.

15 ministérios viraram 22. Isso nem seria um cavalo de batalha não houvesse a terrível mensagem da extinção do Ministério do Trabalho numa época de tamanho desemprego, algo que nem a ditadura teve coragem de fazer.

Aí vêm ministros envolvidos em investigações, como o do Meio Ambiente, que é réu em ação ambiental, num verdadeiro escárnio aos princípios constitucionais.

Há também a ministra que quer impedir que os jovens façam faculdade onde bem entenderem.

Se nas relações exteriores, os governos petistas tinham uma aproximação vergonhosa com ditaduras, o governo Bolsonaro agora se propõe a nos fazer passar vergonha perante o mundo nos retirando, só para começar, de um pacto de migração. Logo o Brasil, destino número um dos imigrantes na América do Sul e também com milhões de seus nacionais espalhados mundo afora.

Nossa política internacional agora é seguir as loucuras de Donald Trump, um presidente cuja sanidade é seriamente questionada em seu próprio país. Nem tamanho para isso temos.

Sobre a educação, o empenho parece mesmo ser para destruir o que nos resta a respeito. Além de livros com erros e sem respaldo em fontes bibliográficas, Bolsonaro escolheu como coordenador do Enem um economista (?) que plagiou trabalho de um autor americano sobre a Escola de Frankfurt. Plágio é crime. Fake news na educação é quase uma bomba atômica para o futuro do país.

Bolsonaro recuou na questão dos livros. Ufa! Mas não é assustador que o líder da nação trate a educação desse jeito? Sem a atenção da imprensa - talvez daí venha a implicância do presidente com o jornalismo - uma atrocidade como essa passaria incólume e teríamos uma educação fake news com a chancela do MEC.

Não pretendo passar em revista todas as áreas de um governo com apenas 10 dias. Mas não posso deixar de apontar os casos Queiroz e do filho do vice. Para quem prometia ser a régua ética anticorrupção (lembram do PT na primeira campanha de Lula?), os indícios do assessor/motorista com movimentação milionária sem explicação lógica, convincente, e da descoberta de que o filho do vice merece triplicar o salário e uma indenização robusta quando deixar a nova função no BB justamente poucos dias após ascensão do pai como o segundo homem da República mostram claramente que as velhas práticas políticas não acabaram, apenas trocaram de mentor.

Se com apenas 10 dias o governo Bolsonaro já está se esfacelando desse jeito, é bom ficar de olho para que ele não arraste o país junto. Afinal, a lua de mel do mercado financeiro com novos governos não é eterna. E com a economia americana soluçando, é preciso cuidar do pouco que nos resta. Uma volta ao Brasil dos anos 80-início dos anos 90, com exceção das artes, é pesadelo que ninguém gosta nem de cogitar.

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