segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Deu no New York Times

Impossível não lembrar da música do grande Jorge Benjor. O descalabro penintenciário brasileiro e a seu último "acidente pavoroso", como disse o presidente Michel Temer, ocorrido aqui em Alcaçuz foi destaque no maior jornal do mundo, o americano The New York Times. 

Segue abaixo uma tradução livre da reportagem de hoje. Quem quiser praticar o inglês pode conferir a original aqui.

Contagem de mortos do motim de prisão no Brasil atinge 26; decapitações são vistas
Por Dom Phillips

RIO DE JANEIRO - A contagem de mortos de um motim numa penitenciária no Nordeste brasileiro subiu no domingo para 26 detentos, aumentando o número de assassinatos nas prisões do país neste ano para mais de 120.
Decapitações e mutilações são comuns nas prisões superlotadas e violentas do Brasil, nas quais 40% dos presos ainda não foram condenados, mas a mais recente onda de brutalidade deixou muitos aqui horrorizados.
O motim começou por volta das 5 da tarde no sábado na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, a 13 milhas de Natal, no estado do Rio Grande do Norte, e continuou até por volta das 7 da manhã no domingo, quando policiais de choque controlaram a prisão.
"A situação de rebelião está controlada", disse o Major Eduardo Franco da polícia do Rio Grande do Norte. 
No domingo, as autoridades inicialmente disseram ter encontrado 27 corpos, mas a contagem de mortos foi revisada mais tarde para 26; o Major Franco disse que havia ocorrido um erro. Muitos dos corpos foram mutilados.
Wilma Batista, diretora do sindicato dos agentes penitenciários do Rio Grande do Norte, enviou uma fotografia de dois corpos decapitados e esquartejados no pátio da prisão através de um serviço de mensagens por celular e disse que havia visto muitos outros.
"Nós estamos chocados", ela disse.
Com o Brasil atolado na recessão, o governo do presidente Michel Temer cambaleando de um escândalo de corrupção a outro e uma onda de violência prisional aparentemente incontrolável, muitos brasileiros sentem que estão voltando a  um recente passado mais sombrio, em que o crime, a violência e a corrupção estavam fora de controle.
"Achávamos que havíamos virado essa página, mas agora está tudo voltando", disse Maurício Santoro, professor de relações internacionais e ciência política da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. 
Os assassinatos refletem o aumento da guerra mortal entre facções que explodiu quando 56 detentos foram massacrados em Manaus, no estado do Amazonas, em 1.º de janeiro. Mais quatro foram mortos no dia seguinte noutra prisão da cidade. 
As autoridades estaduais atribuem as mortes de Manaus à Família do Norte, uma facção do tráfico de drogas que havia atacado detentos ligados a uma facção rival, o Primeiro Comando da Capital, de São Paulo, conhecida pela abreviatura PCC.
Acredita-se que as facções estão lutando pelo controle de lucrativas rotas de contrabando de drogas. Durante anos, o PCC foi aliado de uma facção de drogas do Rio de Janeiro chamada Comando Vermelho. No ano passado, a aliança acabou, deixando um rastro de assassinatos nas prisões.
Em 6 de janeiro, após o massacre de Manaus, 33 presidiários foram encontrados esquartejados numa prisão em Boa Vista no estado de Roraima, bem ao norte do Brasil. As autoridades estaduais disseram que o PCC estava por trás dos assassinatos. Mais 4 presos foram mortos numa terceira prisão de Manaus depois de terem sido transferidos do lugar do primeiro massacre.
O motim da noite de sábado começou quando presos ligados ao PCC se rebelaram durante o horário de visitas, a senhora Batista disse. Eles estavam numa prisão separada, Rogério Coutinho Madruga, que fica ao lado de Alcaçuz e é parte efetiva do mesmo complexo. Ela disse que apenas seis agentes penitenciários estavam de serviço e que eles conseguiram libertar os visitantes antes de recuarem para o outro bloco.
"Os agentes salvaram os visitantes e tiveram que se retirar", afirmou a senhora Batista.
Os presos que escaparam então atacaram um bloco dentro da prisão de Alcaçuz que abrigava homens de uma outra facção, o Sindicato do Crime do Rio Grande do Norte, disse a senhora Batista.
Desde 2015, muitas das celas de Alcaçuz não têm grades, e os prisioneiros locomovem-se à vontade 24 horas por dia, disse a senhora Batista.
Policiais e guardas prisionais conseguiram impedir que a matança se espalhasse ainda mais, mas a energia elétrica do presídio foi cortada. A polícia decidiu esperar até o amanhecer para entrar, e contiveram parentes desesperados que tentavam entrar.
Lincoln Gakiya, promotor de uma unidade de crime organizado em São Paulo que se especializou no PCC, disse que a separação do Comando Vermelho estava por trás da crise. A facção do Rio aliou-se a outras cinco facções pelo Brasil, incluindo o Sindicato do Crime.
"Esta guerra é pela hegemonia do comércio de drogas", o senhor Gakiya afirmou. "O sistema prisional não está preparado para esta guerra de facções. Não há espaço para separar as facções. O sistema está superlotado, então a tendência é piorar."
Um vídeo de celular circulava nas redes sociais mostrando um homem com o rosto coberto, brandindo o que parecia ser uma machete ou espada, andando entre um grande número de corpos mutilados no que aparenta ser o pátio do presídio. As letras PCC foram rabiscadas aparentemente com sangue numa parede.
Embora seja impossível confirmar a veracidade do vídeo, os corpos visíveis estavam com shorts azuis similares aos usados pelos presidiários vistos nas reportagens locais. Vídeos horríveis como este circulam desde os ataques.
O subtenente Eliabe Marques, policial e presidente da associação de subtenentes policiais e bombeiros, afirmou que a disputa entre Sindicato do Crime e PCC cresceu muito recentemente.
"Na cadeia, o preso tem que se juntar a uma ou outra das facções, PCC ou Sindicato do Crime", ele disse. É um fenômeno que está tornando a situação no Rio Grande do Norte ainda mais séria."
A senhora Batista disse que o sindicato dos agentes penitenciários avisara a respeito das condições potencialmente explosivas dentro do presídio, mas foi ignorado.
"É muito triste, não apenas pelo esquartejamento, mas de ver o o crime organizado enfrentar o estado, o poder estatal, deixando mais cicatrizes nos agentes penitenciários que sofrem psicológica e fisicamente por uma profissão tão estressante", afirmou.

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