domingo, 7 de janeiro de 2018

Ed Motta e Pabllo Vittar

Na atual profusão de imbecilidades intolerantes que vemos nas redes sociais, a polêmica do momento é Pablo Vittar. Quem gosta afirma que os haters só depreciam seu talento (ou a falta dele) pelo fato de Vittar pertencer à comunidade LGBT. Quem não gosta afirma que não tem nada a ver com homofobia, e sim com gosto mesmo, já que seriam fãs de cantores gays assumidos como Ney Matogrosso e Freddie Mercury.

Primeira coisa, gosto é como nariz - cada um tem o seu. Eu, por exemplo, não suporto esses enlatados comerciais, como forró, funk, sertanejo e assemelhados. Mas não perco meu tempo a tentar convencer quem quer que seja a deixar de gostar de tais estilos e/ou de seus representantes de poucos recursos musicais em minha modestíssima opinião. Também não me engajo numa luta enraivecida a depreciar quem quer que seja; tenho mais o que fazer na vida - viver é uma delas.

Segunda coisa, não acredito que a cruzada anti-Pablo Vittar tenha qualquer relação com sua homossexualidade. Desconfio que o incômodo parta do fato de que ele é um homem que se veste abertamente como mulher e, pior, faz sucesso. Até então, havia um pacto não falado de que drag queens seriam criaturas noturnas, restritas a casas de show, música eletrônica, dublagens ou espetáculos de humor. Cantar música brega, ou popular, e fazer sucesso com isso no Brasil inteiro é visto como uma afronta pelas mentes da Idade Pedra.

Terceira coisa, a música de Pablo é chiclete, grudenta, fica na cabeça, querendo ou não. O que a difere de muitas outras que têm até pior tipo de mensagem nas letras? Em seus sucessos, não há uma linha mandando sentar aqui ou ali, ficar de quatro, mostrar a bunda, pagar a prostitutas, humilhar os outros por causa de dinheiro ou classe social, ou qualquer incitação a violência, como dizer que vai bater em quem quer que seja, ou matar, ou difamar e por aí vai, como vemos em sertanejos, funks e afins.

Sobre a voz, a grande controvérsia. Eu vejo em Pablo Vittar tão-somente falta de técnica vocal. Voz existe. Assim como tantos outros da música brasileira e internacional. Há casos em que há técnica, mas a voz passou longe. Não vou citar nominalmente porque não pretendo começar outra batalha de quem tem ou não tem talento, ainda mais se um dos nomes é daqui do RN.

Se o timbre de Pabllo Vittar destoa do padrão, celebremos. A música precisa de diversidade. Ana Vitória e Ana Vilela também destoam. Assim como Fernanda Takai (Pato Fu), que canta com uma voz tímida, às vezes até desafinada, mas tão marcante em seus sucessos. Já basta o padrão voz rouca e grave das cantoras do axé, do forró, do sertanejo. Ou vozes anasaladas como as de Fagner, Anitta e Paula Fernandes. Suavidade também agrada. Tons agudíssimos, como os de Tetê Spíndola, também agradam. Sussurros como os de Paulo Ricardo e Justin Bieber também agradam. Ainda que seus estilos desagradem. Ou agradem. Afinal, todos agradam e desagradam porque não temos gostos iguais.

O que assusta mesmo é o nível de agressividade demonstrada contra Pabllo Vittar. Não vi isso contra a voz (?) de cantor algum do funk. Ou a ausência de voz/afinação dos cantores (masculinos) do axé. Ou a marmota padronizada dos cantores das bandas de forró, a ponto de ninguém saber quem danado está cantando (?) sem que o próprio cantor anuncie no meio da música o nome da banda.

Então, se você anda perdendo seu tempo nas redes sociais postando coisas depreciativas apenas sobre Pabllo Vittar, você não faz isso por homofobia nem por falta de talento daquele(a). Você faz isso por aversão ao que Pabllo Vittar representa (um homem vestido de mulher e fazendo sucesso em todas as classes sociais) e, principalmente, porque falta a você fazer algo para valorizar mais sua vida e as pessoas que estão ao seu redor. Sim, porque cada vez que você se enfia nas redes sociais para se incomodar com Pabllo Vittar e seu sucesso (existindo talento ou não), você deixa de viver a vida e de aproveitá-la com quem realmente importa: as pessoas amadas.

Eu, por exemplo, adoro jazz e música clássica, que não tocam em canto algum. Então, para me livrar dos sons não apreciados, fiz uma conta no Spotify e escuto apenas o que me agrada. Nada de sertanejo, forró, axé, etc. Isso fica para quando estou com meus amigos, que têm gosto totalmente diferente do meu. Não reclamo, nem faço campanha contra. Afinal, a beleza da vida é a diversidade, inclusive de gostos. E viva Pabllo Vittar!

Agora transcrevo parte de reportagem (Tribuna do Norte, 05/01, pág. 3 do caderno Viver) a respeito de comentário de Ed Motta, conhecido como um chato de galochas, mas cujo talento é fonte de minha admiração, a respeito de Pabllo Vittar, e publico logo abaixo o vídeo que o embasou, em que há a interpretação da dificílima I have nothing, da incomparável Whitney Houston:

Ed Motta elogia Pabllo Vittar: 'Talento verdadeiro e genuíno'
Ed Motta fez uma postagem em suas redes sociais elogiando o timbre da voz de Pabllo Vittar. "Essa semana tive uma surpresa imensa assistindo o vídeo da Pablo Vittar cantando um grande sucesso da Whitney Houston. Eu chorei de verdade vendo porque não imaginava essa musicalidade, timbre lindo nas notas graves e quando atingiu as notas altas foi com propriedade. Depois conferi pelo YouTube que faz tempo que o talento dela é verdadeiro e genuíno", escreveu o cantor, conhecido crítico dos movimentos de música pop.
"Por preconceito, admito, eu sempre duvido artisticamente do que é muito popular, do prato mais pedido do cardápio, do filme premiado". diz no texto. Pablo faz um sucesso imenso, mas também tem um exército de ódio yang que se incomoda profundamente com o que isso representa na sociedade obediente e engessada. Pablo Vittar tem o meu respeito", garantiu.

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