A vida é tão cheia de umas verdades assumidas que chega a ser engraçada. Estereótipos e preconceitos também aparecem, só que aí não há nada engraçado. Mas isso fica para outra postagem.
Nesta semana que passou, duas vezes recebi a mesma pergunta, embora em ocasiões diferentes. Não foram as primeiras a respeito e certamente não serão as últimas. Em ambas a mesma surpresa advinda das tais verdades assumidas. Explico sem mais delongas.
Há 21 anos que o inglês faz parte da minha vida. Diariamente, mesmo que não por muitas horas. Eu ainda nem tinha prestado meu primeiro (e único) vestibular quando comecei a dar aulas na mesma escola de línguas em que aprendi a falar a minha segunda língua.
Nem me imaginava dando aulas. Foi meu avô e grande conselheiro que me provocou "Minha filha, quem ensina aprende muito mais." Tinha e ainda tenho muito respeito pelo que meu avô apontava. O sergipano tinha um conhecimento de mundo enorme! Até para discordar eu precisava de muitos e bons argumentos. Segui seu conselho e não me arrependi.
Foi dele também o pedido para que eu não cursasse Direito à noite na UFRN. Disse que não dormiria bem nunca mais sem saber se eu havia chegado em casa. Na hora de preencher a ficha do vestibular, meti Direito matutino, sem pestanejar. Nunca me arrependi. Nem mesmo quando passei num concurso do Banco do Nordeste já no finzinho da universidade e fui convocada para o setor jurídico em Mossoró e meu avô me pediu que não fosse para longe da família porque eu não estava passando fome para isso (eu ganharia menos no banco do que como advogada e professora, mas teria a tão sonhada estabilidade). Não fui. Nem aí me arrependi.
Há 17 anos eu me encaminhava para acabar a faculdade e ouvia os lamentos da direção do curso a respeito da perda da professora de inglês. E não adiantava eu dizer que não pretendia abandonar as minhas turmas, mesmo sabendo que o horário seria mais restrito: todo mundo já assumia a verdade de que onde existia a advogada não caberia a professora de inglês.
Para resumir, estagiei na OAB com a querida Dra. Margarida, me formei, passei à advocacia, sem nunca largar o ensino de inglês. Nem quando fiz Especialização em Direito Constitucional na UFRN. Nem quando me tornei professora da Prática Jurídica da UFRN por 2 anos - período que coincidiu com a Especialização. Nada. Nessa época, até a turma das terças e quintas à noite não aceitou trocar de professora (a Especialização era toda segunda, terça e quarta à noite) e conseguiu me convencer (e à escola também) a termos aulas nas quintas e sextas à noite. Foi corrido, mas valeu à pena. Tudo que se faz com amor e prazer é gratificante.
Por que digo isso? Porque sempre que alguém descobre que sou advogada e professora surge logo o questionamento: "E você exerce a advocacia?". Não foi diferente nesta semana, como eu disse, em duas oportunidades diferentes. Até alunos me perguntam isso. Talvez seja o triste reflexo do desprestígio por que passa a profissão de professor especialmente no Brasil. Aí todo mundo tem na cabeça que uma coisa exclui a outra.
Não para mim. Amo ensinar. Amo lutar pelo que é certo. Por que teria que escolher entre uma coisa e outra? Isso parece até algo como ter que escolher entre gostar de comida brasileira ou de comida japonesa; chocolate ou sorvete; livro ou música; amor ou sexo; futebol ou filme; cinema ou teatro e por aí vai. Claro que a maioria das coisas não podem ser feitas ao mesmo tempo e, obviamente, não dou aula no horário de escritório/audiência (embora o Judiciário adore testar se eu tenho como comparecer a duas audiências no mesmíssimo horário, mas em locais diferentes).
O nó aumenta quando a descoberta inclui o Só Futebol? Não! . "Você tem blog? E é advogada? Mas exerce a profissão?". Sim, sim, sim. Quando uma profissão está mais estressante, a outra serve de calmante. Quando as duas estão me enlouquecendo, é neste blog que eu encontro refúgio. E aqui é o puro amor à discussão que impera. Afinal, como blogueira e metida a fazer Podcasts, sou a melhor personificação de amadora.
E tem mais: na paixão pelo Direito e pelo Inglês já fiz traduções (do Português para o Inglês) de teses jurídicas apresentadas em universidades inglesas e que viraram obra jurídica posteriormente. Por questão de direitos autorais não posso nominar a obra, mas já me basta a satisfação (enorme) de ter colocado as duas áreas juntas para ajudar trabalho bem sucedido de um conterrâneo.
Confesso que, de uns tempos para cá, ando sentindo falta da professora de Direito no meu atribulado dia a dia, mas ainda não encontrei a oportunidade na rede privada que me foi dada, mesmo em vínculo temporário, pela minha querida UFRN. Talvez seja hora de retornar às origens em novo vínculo temporário. Talvez. Não gosto muito da ideia de um trabalho com ponto final já marcado. Parece que estamos jogando energia fora. Pensarei nisso mais à frente.
O que importa hoje é apontar como alguns pensamentos são assumidos como verdades absolutas sem que se saiba exatamente de onde surgiram tais ideias. E como de verdade essas ideias não tem nada. Não mesmo. Pelo menos, não quanto às minhas atribuições. E olha que, como mulher, ainda faltou falar que sou filha quase mãe, tia, sobrinha faz tudo, irmã, companheira, amiga...
Gostei muito em saber mais um pouco de você durante os anos que seguiram a sua coluna no site futeboldorn.com.br (não existe mais) Não esqueço de suas opiniões bem expostas sobre o futebol. Além de advogada e professora de inglês também és uma grande comentarista de futebol, fato não comum nessa área, pois até parece o clube do Bolinha (risos). Parabéns pelo blog é postcast porque tenho aprendido com eles.
ResponderExcluirPaulo, você sempre terá um lugar especial no meu coração. Muito obrigada por tudo.
ResponderExcluirGrande orgulho de ter sido seu aluno e atualmente amigo, apesar de continuar sempre aprendendo com você!
ResponderExcluirSempre me causou muita emoção uma aluna estudar inglês com vários professores e, atualmente, vários deles lhe procurar durante o intervalo para tirar dúvidas ou debater algum tema. Presenciei isto diversas vezes.
Com certeza tomara mais uma decisão acertada na sua vida.
Abraço,
Wallyson Glaydson Gomes de Almeida
Orgulho recíproco, Wallyson. Muito obrigada.
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