O bom de entrevistas coletivas, especialmente as realizadas no calor dos fatos, é que elas não deixam muito espaço para o raciocínio. E assim, sem querer, surgem as grandes verdades nas entrelinhas.
Foi assim ontem com Felipão. Perguntaram se estava tudo errado. Ele disse que não. Que 12, 13, 14 jogadores desta seleção estarão na próxima copa. Que foi assim com a Alemanha, por exemplo. Só não deu tempo de ele admitir que não foi assim com o Brasil.
Da Copa 2010, apenas Júlio César, Thiago Silva, Maicon, Dani Alves e Ramires. Chutou-se tudo para cima e resolveram partir do zero com uma geração absolutamente inexperiente.
Isso não apaga a realidade brasileira de time sem esquema tático. Qual era a grande jogada do Brasil? Toca para Neymar que ele resolve? Não resolveu nem contra o Chile, nem contra a Colômbia. Nem contra o México lá atrás. Não fez falta contra a Alemanha. Um amontoado em campo contra uma seleção superorganizada. Saiu barato, já que a Alemanha naturalmente diminuiu seu ritmo.
Mas esse é o futebol brasileiro. O futebol que exalta o drible, a malandragem dos que cavam pênaltis, faltas, idolatra um jogador em detrimento do coletivo. O futebol de salvadores da pátria. O futebol que reclama que esquemas táticos robotizam os craques. Ora, desde quando organização impede talento? Desde quando o caos é o melhor ambiente para o talento aflorar? Cheguei até a ler nesta copa que o fato de Neymar e Oscar serem obrigados a marcar acabava com seu futebol. Santa inocência, Batman. Todo mundo marca no futebol atual. O que mata o futebol de craques são times medíocres, sem jogadas treinadas, que vivem de improviso, de chutões para cima, da famigerada bola parada.
O Brasil não caiu antes porque enfrentou seleções de menor poderio quanto ao talento. Quando enfrentou uma de nível semelhante, mas muito acima em organização tática, foi sumariamente humilhada, deixando o mundo inteiro estupefato ante uma goleada de 7 no time da casa numa semifinal de copa do mundo.
Nenhum talento individual é capaz de se sobrepor ao trabalho coletivo. "11 são mais que 1" parece ser uma afirmação óbvia. Não no futebol brasileiro. Ainda há quem pense que treinador só serve para entregar camisas ou motivar o time. E assim temos um campeonato brasileiro ridículo em público e audiência, com enorme ajuda de gramados ruins e horários malucos.
Eis um legado da Copa 2014: gramados espetaculares, estádios de grande serviço agregado. Mas e os horários? E os treinadores? Quando aprenderão a montar jogadas de ataque? Quando soltarão seus laterais? Quando deixarão de ser meros destruidores das jogadas adversárias? Quando deixarão de ser meros entregadores de coletes? Quando vão aprender esquemas táticos de verdade?
Pobre futebol brasileiro. Ainda viveremos alguns anos achando que o que aconteceu ontem foi uma fatalidade que nunca mais se repetirá. Pior: ainda aguentaremos imbecis cheios de razão sobre como o Brasil vendeu a vaga na final para a Alemanha, igualzinho à tal venda da final da Copa 1998 para a França. Não sabemos perder. Não reconhecemos nossas falhas. Não enxergamos a qualidade dos adversários. Não aprendemos com as adversidades.
E assim seguimos na ilusão arrogante de que temos o melhor futebol do mundo. E seguiremos com clubes endividados, envolvidos em esquemas com empresários de futebol que só querem vitrine para sua mercadoria, com treinadores que ou são marionetes, ou estão tão ou mais envolvidos nesse esquema de "exportação de craques". E o torcedor se contentando com espetáculos deprimentes seja pela TV, seja ao vivo. Até quando?
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