segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Um novo Boa

Que me perdoem os dirigentes do América, mas ao ver as contratações do clube para a temporada 2016, a impressão que fica para mim é que o América é o novo Boa Esporte Clube.

Para quem não sabe, o Boa é um clube novo de Minas Gerais, quase sem torcida, e cujos plantéis têm uma marca registrada: são formados em sua maioria por atletas que queimam os últimos cartuchos na tentativa de deixar o franco declínio para trás. Aliás, até a comissão técnica só dá certo (quando dá) lá.

É bom ressaltar que a estratégia nem sempre foi fracassada, mas não lembro de uma grande conquista do Boa. Nem torcida ele consegue!

Aplicar essa estratégia de UTI dos desesperados num clube centenário, acostumado a conquistas e com uma torcida extremamente exigente revela que os dirigentes americanos são arrojados e não temem o risco de tal empreitada. Desde o treinador, que não deu certo em canto algum, até a chegada de Neto Potiguar e Ramon, afora outros encostados, inclusive ex-ABC, a exposição ao risco cresce exponencialmente e preocupa sobremaneira os torcedores americanos.

É claro que pode dar certo! Já vimos muitas bizarrices terminarem em conquistas. Mas os fracassos superam e muito o sucesso dessas misturas arriscadas, o que acende o alerta da torcida.

Apostar em jogador barato que jogava num clube qualquer, OK. Deu certo por aqui inúmeras vezes. Mas muito macaco velho reunido pode levar a safra inteirinha para o lixo.

É preciso cuidado com a tradição. O Boa não está para o futebol de Minas nem perto do que o América representa para o futebol do RN. O que funciona (?) lá pode ser um verdadeiro tiro no pé aqui.

Tite no RN

Abordei a questão da continuidade de jogadores e treinadores algumas vezes por aqui. Destaco duas vezes em que falei do América ainda com os campeonatos rolando: Um mínimo de estabilidade, por favor e Estabilidade é a chave, em março e outubro, respectivamente.

Agora todo mundo aplaude a fórmula mágica de Tite no Corinthians. Que tal voltarmos no tempo para vermos uma declaração dele em maio, após a eliminação na Libertadores e no Paulista: "Sobre reformulação temos que ter cuidado. Futebol não é assim, tem outro componente, a construção de uma equipe demanda tempo." (ESPN)

No Estadão de domingo, Tite falou sobre como montou o esquema vencedor:

"Não sou mágico, muito menos criei a roda. Eu só fiz adaptações, reciclagem e mudanças na equipe. (...) Dizem que o 4-2-3-1 é muito parecido, mas não é. O posicionamento do meio de campo no 4-1-4-1 é mais avançado e mexe na estrutura da equipe. O Renato Augusto, por exemplo, alterna movimentos ofensivos e defensivos com o Elias, que também ajuda na criação e na infiltração. (...) Quem joga pelos lados do campo tem características distintas. Um é agressivo e vertical. O outro é construtor e criativo. A Alemanha tem Müller e Ozil. Nós temos Malcom e Jadson. (...) No começo do ano, não imaginei que esse homem de criação seria o Jadson. Pensei que pudesse ser o Renato Augusto porque na Europa ele já tinha exercido essa função. Na sequência, o Jadson começou a fazer esse papel de maneira extraordinária. (...) A defesa com uma linha de quatro fixa, compacta, proporciona a 'Cavadinha' a todo instante. No City, o David Silva faz muito bem isso. Aqui, Danilo, Jadson e Renato buscam o mesmo. (...) O Barcelona faz pressão alta quando joga contra times que jogam atrás. O treinador demarca o campo na faixa intermediária e, durante 12 minutos, pede que os titulares não deixem os reservas darem mais do que cinco toques na bola. Se você ver Neymar, Messi e Iniesta fazendo essa marcação é impressionante. Os caras vão para dentro."

Perder Paulistão sem reformular equipe e comissão técnica? 4-1-4-1 com um jogador não tão vertical e o famoso poste isolado lá na frente? Craque da equipe marcando no lugar do volante? Craques fazendo treinos de 12 minutos de marcação pressão feita por eles? Tite não aguentaria um mês no futebol do RN. Seria tachado de enganador, retranqueiro ou professor Pardal. Ou os três juntos.

Voltando à continuidade, por aqui, fazia tempo que não via um treinador começar e terminar a temporada (Roberto Fernandes, América, 2015). Mas foi só uma andorinha. Em 2016, tudo indica que a normalidade voltará para América e ABC. A média é de 3 partidas de paciência. E neste ano a terceira rodada do estadual traz o clássico entre os maiores rivais centenários. Já estou com pena de Aluísio Guerreiro e Sérgio China.

domingo, 6 de dezembro de 2015

É preciso estar preparado

Ao longo dos anos, a vida me ensinou que quase tudo nela requer preparação. É preciso estar preparado até para receber um prêmio de loteria, sob pena de enlouquecer, cair em depressão ou terminar na miséria.

A leitura de um livro também requer preparação. Essa eu aprendi na faculdade. Dê um Caio Mário a quem dá seus primeiros passos no Direito Civil e a aversão será quase que instantânea. Algum tempo depois a leitura do mesmo autor torna-se extremamente agradável, quase como saborear um vinho para especialistas. Ou seja, se você achar algum livro difícil, volte a ele alguns anos depois.

A verdade também requer preparação. Quem bem retratou isso foi o excelente filme Matrix. Nele, um dos personagens não consegue conviver com a realidade de um mundo cheio de agruras e prefere voltar a ser mais uma pilha adormecida iludida pelo grande computador. O mundo dos sonhos, sabidamente irreal, era o seu lugar.

Não é preciso ir longe para encontrarmos gente assim todos os dias. Ser portador de uma verdade pode lhe transformar em inimigo dessa gente, afinal nem todo mundo deixa com tranquilidade a ilha da fantasia. Quem é assim defenderá com unhas e dentes a ilusão em que vive.

É uma angústia sem fim ter apego à verdade. No entanto, o pior é ter que aguentar aquele que gosta de mentir achando que você tem QI de dois dígitos. Ele está lá, cheio de si, achando que a inteligência de seus alvos é tão profunda quanto um pires e por isso jamais será descoberto. Nem percebe o camarote que se forma de gente que sabe que a preparação para a verdade ainda não chegou, mas chegará.

Quantas pessoas que conhecemos se encaixam num dos dois lados dessa descrição? Desde a sua casa até os maiores altares do poder, encontramos gente assim aos montes. Felizmente, não são maioria absoluta ou o mundo seria insuportável.

A mentira também requer preparação. É que o repertório não é tão vasto, especialmente quando se trata de tentar enganar quem vive de comparar palavras com ações. Afinal, como diz um ditado em inglês actions speak louder than words (as ações falam mais alto do que as palavras). 

Assim, é preciso estar preparado para lidar com mentiras, mentirosos e enganados. Às vezes, a união entre eles é tamanha que é melhor esperar que a vida encaminhe a melhor solução. Não valem o esforço. Pode ter certeza.

Mais dois filmes

Nessa semana, conferi dois filmes em cinemas diferentes: 007 contra SPECTRE no Cinépolis e Vai que Cola no Cinemark. Em ambos pelos menos uma decepção diferente.

007 contra SPECTRE tem o desenvolvimento esperado para um filme de James Bond. Bond girls (embora dessa vez a cena mais quente tenha ficado com uma Bond woman ao estilo "os melhores vinhos são os mais antigos"), explosões, supercarros, tetos desabando, cinismo exalando do agente e por aí vai.  Só que o enredo, no afã de retomar os filmes anteriores com Daniel Craig, termina por enfraquecer e muito a motivação do vilão. Senti-me enganada. Não fosse isso o filme teria acertado em cheio, uma vez que o diretor Sam Mendes não deixou a obra arrastada em nenhum dos longos 150 minutos.

Dessa vez, adicionei manteiga à pipoca do Cinépolis para ver se consigo entender como ela foi eleita a melhor do Brasil. Ainda não cheguei lá.

Sobre Vai que Cola, o filme não fez jus à série, que é pelo menos gravada perante público no teatro. Ambos entraram numa onda de metalinguagem (personagem falando da obra - criticando a cena, o texto, etc.) que eu considero pobreza de roteiro. Uma característica dos filmes de Paulo Gustavo é que tudo é centrado nele, não em seus personagens. Isso contribui para a adoção da metalinguagem. Não gosto.

Aliás, acho outra pobreza de recurso ator ficar esquecendo texto e demonstrando isso à plateia como forma de arrancar risos. Seu ofício é interpretar personagens de forma convincente, não mostrar ao público como errar é engraçado. O mesmo pode ser dito de ator que ri em cena para puxar a risada da plateia. Acho uma tremenda falta de profissionalismo. 

Sobre a pipoca do Cinemark, mais uma vez eu me questionei como a do Cinépolis foi eleita a melhor do Brasil. Deve ser porque quem escolheu gosta daquelas com firula - com molho de limão, por exemplo. Para mim, pipoca é a tradicional. E nesse quesito eu devo ter sido sorteada com dois lotes abaixo do padrão melhor do Brasil lá no Cinépolis.

Nesta semana, talvez eu confira O Presente no Moviecom. Gostei da sinopse e do trailer. Se assistir mesmo, eu conto se atendeu à minha expectativa.

sábado, 5 de dezembro de 2015

Péssima impressão

Segundo dia de Carnatal, transmissões ao vivo cada vez mais truncadas com propagandas intermináveis e entrevistas em que os entrevistadores querem falar mais do que os entrevistados, eis que a TV mostra a Band Natal e os entrevistadores falando com o cantor baiano Bell Marques. Com os entrevistadores também estava a cantora baiana Mari Antunes.

Os apresentadores falam ao cara sobre a música que a moça acaba de lançar. Ele simplesmente dá de ombros e fala da música dele. Depois de muito lengalenga, o apresentador, percebendo o desprezo do cantor em relação à cantora, resolve dizer quem era a moça, talvez na esperança de demonstrar que aquela era uma conterrânea e companheira de profissão, vocalista de uma banda de certa expressão (Babado Novo) e recebe de resposta "Mari Antunes?" e um absoluto tom de desprezo.

Um horror! Já não sou fã do estilo (Ivete escapa, mas não ilesa) e tendo visto tamanha falta de humildade e solidariedade em relação a alguém que está começando sua luta, a impressão que me ficou foi a pior possível. Nem um pinguinho de educação. A opinião que tinha sobre ele (cantor que costumava cantar as duas primeiras palavras da estrofe e deixar o resto a cargo do público) piorou e muito depois do ocorrido.

No mínimo, deselegante. Perdeu completamente meu respeito como ser humano. 

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Escravos do tempo

Pode parecer clichê, especialmente por faltarem pouco mais de 20 dias para o fim do ano, mas tenho impressão de que nos tornamos escravos do tempo. Vivemos para ele e em função dele, sem nos tocarmos de que sua passagem fatalmente nos encurta a existência.

Torcemos para que ele voe. Que chegue logo a sexta; que venha o feriado; que cheguem as férias urgentemente; que o ano acabe depressa. Para quê? Corremos muito, mas sem destino. Ansiamos pelo amanhã e esquecemos que o hoje foi o amanhã de ontem. 

A vida vai passando não como uma sucessão de eventos significativos e, na medida do possível, diários, mas como uma corrida até o que vem depois. Estamos sempre apressados e sem tempo. 

De vez em quando tenho saudade de quando o tempo não se arrastava; ele nem parecia existir. Nada era mais interessante do que ver o curioso funcionamento do esguicho do jardim, levando água num verdadeiro balé até os cantinhos mais distantes da grama. Ou acompanhar as filas de formiguinhas até seu formigueiro. Comparar o reflexo das imagens em cada uma das bolas da árvore de natal.

Tudo isso seria perda de tempo hoje. O precioso tempo deve ser gasto com coisas mais importantes. Fiquei procurando o que seria mais importante do que viver e fazer valer cada segundo que passa...

Fechamos os olhos e o tempo de escola parece que foi ontem, mas já nos deixou há algumas décadas. Assim mesmo a faculdade, os nossos avós, os encontros diários com os amigos.

Que feitiço será esse que nos prende ao amanhã, nos faz desprezar o presente e depois traz arrependimento ante a observação do que passou de passagem por nós? Seremos um dia capazes de entender o tempo a ponto de dominá-lo? Vamos extinguir essa angústia coletiva que nos faz correr não sei para onde o tempo todo? Acharemos enfim a liberdade?

Falta seriedade

O Globoesporte.com divulgou levantamento sobre a média de trocas de treinador nas séries A e B do futebol brasileiro. Em 2015, foram 32 trocas em cada uma das duas séries, muito acima da média na A e abaixo na B. Apenas um treinador foi mantido do início ao fim da Série A: Tite (Corinthians). Na B, quatro passaram incólumes: Givanildo Oliveira (América-MG), Júnior Rocha (Luverdense), Dado Cavalcanti (Paysandu) e Léo Condé (Sampaio Corrêa).

Não se tem notícia de que isso aconteça em outros esportes ou mesmo em campeonatos sérios de futebol mundo afora. Só aqui no Brasil.

Eu tenho uma tese muito particular sobre qual seria o motivo. Para mim, dirigentes já contratam pensando em quem eles vão fritar quando as cobranças começarem. Já perceberam quanto tempo passa até alguém constatar que o problema é de qualidade do elenco? Enquanto isso não ocorre, é a burrice do treinador que não deixa o talento coletivo fluir. Essa lorota leva muito torcedor no bico.

Assim vamos vivendo de oscilação em oscilação, uma vez que, um trabalho que deveria durar no mínimo uma temporada para ser realisticamente avaliado, é utilizado como carta de garantia de dirigentes para suas duvidosas contratações e sobrevive no máximo de três a cinco jogos.

Nem a humildade de reconhecer que só há um campeão ocorre. Por aqui, o segundo colocado é só o primeiro dos últimos.

Sabendo que jogadores de futebol são um povo cheio de melindres, esse tipo de comportamento dos dirigentes brasileiros dá todo tipo de pano para as mangas de atitudes nada éticas em conluio com empresários. Num trabalho sério, o treinador é fulano sem choro nem vela, nem fita amarela. Quem espernear ou sai, ou fica encostado. Simples assim. Por algum motivo, o futebol brasileiro não se adapta à seriedade. No entanto, é inegável que tal ambiente de falta de seriedade só favorece a corrupção.

Não causa a menor surpresa o fato de que os clubes brasileiros estejam afundados em dívidas. Pena que só agora surjam as primeiras notícias de dirigentes envolvidos em corrupção. Mas antes tarde do que nunca.

É preciso enxergar que esse caminho de futebol caro, ruim, sem seriedade e envolvido em todo tipo de corrupção afasta quem paga pelo espetáculo. E depois que uma imagem ruim se forma, sua desconstrução para a formação de uma nova imagem limpa leva muitos anos. Infelizmente, acho que o futebol brasileiro ainda está longe de formar uma imagem limpa. 

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Os melhores de 2015

Adoro essa polêmica de melhores do ano. Toda escolha reflete gostos pessoais. Basta ver as listas que rolam nessa época. Comigo não poderia ser diferente. Mas 2015 deixou algumas escolhas bem difíceis por falta de grandes opções, como as laterais.  Ou fáceis, como a de dirigente. Ou a de atacantes, que teve como parâmetro o número de gols marcados, ante a péssima fase na hora da onça beber água. Levando em consideração o que vi no Estadual, na Copa do Nordeste, na Copa do Brasil e nas Séries B e C, eis os destaques de 2015:

Goleiro - Pantera (América), apesar do frango contra o Cuiabá.
Lateral direito - Reginaldo (ABC), embora Maguinho (América) tenha feito um excelente finzinho de temporada.
Zagueiro central - Flávio Boaventura (América).
Quarto zagueiro - Zé Antonio Potiguar (América).
Lateral esquerdo - Arthur Henrique (América).
1.° volante - Judson (América).
2.° volante - Zé Antonio Paulista (América), apesar da patacoada contra o Confiança, que custou a classificação à fase seguinte.
Meia direita - Daniel Costa (América, atualmente no Santa Cruz).
Meia esquerda - Cascata (América).
Atacante - Kayke (ABC, atualmente no Flamengo).
Centroavante - Max (América).
Técnico - Roberto Fernandes (América).
Revelação - Mateusinho (América).
Jogo - ABC 0x1 América, no Maria Lamas Farache, no dia 02/05 (Final Centenária do Estadual).
Gol - Mateusinho (América 2x1 Vila Nova, na Arena das Dunas, no dia 30/08, Série C)
Dirigente - Marcelo Abdon (ABC), que teve coragem de sair da arquibancada direto para o departamento de futebol de um ABC combalido. Nunca se furtou a dar entrevista por causa de uma derrota.
Torcida - América, apesar de muito arredia, ainda proporcionou os maiores (ainda muito pequenos) públicos de 2015.
Canal - EI MAXX. A Série C finalmente tem cobertura em HD.
Programa de TV - Arena da TV Ponta Negra. De novo, nota 10 para o formato e para toda a equipe.
Rádio - Rádio Globo Natal. A justificativa é a mesma do ano passado: é a única rádio de Natal que ainda manda pelo menos alguns de seus profissionais averiguarem todos os jogos in loco.
Programa de rádio - Rádio Vermelho de Paixão (internet). Feita por torcedores e num formato interessante.
Jornal - Tribuna do Norte.
Site - Blog Marcos Lopes.
Apresentador (TV) - Camila Dantas (Arena - TV Ponta Negra).
Apresentador (rádio) - Sérgio Fraiman (Rádio Vermelho de Paixão).
Narrador (TV) - Jorge Igor (EI MAXX).
Narrador (rádio) - Marcos Lopes (Rádio Globo Natal).
Repórter  - Danilo Ribeiro (InterTV Cabugi).

Arthur Henrique, Judson, Daniel Costa, a torcida do América, EI MAXX (Esporte Interativo), Tribuna do Norte, Arena (TV Ponta Negra), Camila Dantas (TV Ponta Negra), Sérgio Fraiman (Rádio Vermelho de Paixão), Marcos Lopes (Rádio Globo Natal), Danilo Ribeiro (InterTV Cabugi) estão duplamente de parabéns: há 2 anos fazem parte da lista dos melhores.

domingo, 29 de novembro de 2015

Tite na Veja

Novo queridinho do futebol nacional, o técnico Tite está nas sempre ótimas páginas amarelas da revista Veja (edição 2.454, ano 48, n.° 48, 2 de dezembro de 2015, páginas 15-19). Destaco alguns trechos interessantes, mas desde já recomendo que o atento leitor corra até a banca e adquira o seu exemplar para ler a entrevista na íntegra, que relembra inclusive a fase do apelido "Empatite".

O técnico mostrou-se pés no chão e falou categoricamente contra o jogo sujo: "é preciso parar com essa história de vencer a qualquer custo, seja com uma entrada maldosa, seja com uma cusparada na cara." Vamos aos trechos.

Treinador vence jogo 
Participa, é peça fundamental. Mas também erra muito. Em um jogo contra o Coritiba eu chamei o Edílson (lateral do Corinthians) para passar uma instrução e tomamos um contra-ataque. Olhei para o banco e me desculpei: 'Fui eu, estou sabendo'.

O atual estágio do futebol brasileiro
"Mais do que com o 7 a 1, é preciso se preocupar com a identidade do futebol brasileiro. Qual é a forma de jogar que queremos adotar? Encontrada a fórmula, basta trabalhar. Hoje existem duas correntes: uma do passe curto, da triangulação e jogadores compactados no campo, a outra é a do contra-ataque e da marcação forte. A escolha de uma ou outra varia de clube para clube, conforme as características dos atletas. Mas é preciso buscar os bons exemplos, daí o meu intercâmbio na Europa, no ano passado."

O que foi decisivo para o título mundial de 2012
"O emblemático daquele torneio no Japão foi o dia depois do primeiro jogo do Chelsea, contra o Monterrey, do México, uma vitória por 3 a 1. Não foram só os jogadores, mas todo o estafe corintiano sentiu medo daqueles ingleses. Ficou um clima estranho no ar, e eu pensei: 'Agora é minha vez de agir'. Antes do treino, olhei fundo no olho de cada um, aumentei o tom de voz e comecei a falar: 'Lutei a minha vida toda para estar aqui! Apostei tudo! Não vou admitir que alguém venha me dizer que não dá para entrar nesses caras e ganhar o jogo. Ninguém veio aqui para se acovardar'. Foi instantânea a mudança de semblante. Disseram-me depois que foi ali, naquela conversa, que começamos a ganhar a final contra o Chelsea."

Os momentos ruins de 2015
"Houve dois momentos: um particular e outro em grupo. No início do ano, pelo que a equipe estava jogando, eu tinha a convicção de que seríamos campeões do Paulista. Mas tivemos um jogo duro contra o San Lorenzo na Libertadores e perdemos na sequência para o Palmeiras nos pênaltis. Em seguida, veio a eliminação para o Guarani do Paraguai. Além disso, tivemos a saída de jogadores fundamentais. Fiquei muito chateado, frustrado. Foi minha mulher quem percebeu meu estado mais quieto, amuado. Foi ela quem me botou para cima. (...) Dentro do grupo pesou mais a saída de alguns jogadores. Foi então que o presidente reuniu as lideranças da equipe, cinco ou seis atletas, comigo e com o Edu e disse: 'Olha, a partir deste momento ninguém sai mais. Confio em vocês'. Esses dois instantes foram decisivos."

O segredo do sucesso do Corinthians até com time reserva
"Não há segredo. É trabalho. É um conceito que eu trouxe das minhas observações no último ano, tanto na Copa do Mundo quanto na Europa: trabalhar a equipe toda, e não somente os onze que vão começar o jogo, em termos de posição e função a ser executada. Assim, muda-se a peça, mas a confiança é a mesma. Esse foi um dos grandes méritos da equipe. Ela não oscilava muito, manteve o padrão. E a razão para esse sucesso é uma só: treinamento, mas sempre respeitando a posição e a função que o atleta vai exercer no dia do jogo. Isso gera automatismo, memória neuromuscular. Quando você domina o básico, o criativo aparece mais facilmente. Não precisa pensar para fazer o básico. Quando surge a hora da tomada de decisão, abre-se espaço para a criatividade."

A comunicação com os jogadores
"A comunicação se dá por três vias: fala, visão e audição. Às vezes, não sei qual é o canal mais efetivo para influenciar um atleta. Posso levá-lo para dentro de campo para que execute a tarefa. Posso mostrar a ele alguns vídeos para demonstrar o que eu gostaria de ver dentro de campo. Ou simplesmente falo e passo as instruções. Com algum desses três mecanismos eu vou entrar no jogador, não há dúvida alguma."

Tite tem contrato de 3 anos com o Corinthians. É a velha história da continuidade produzindo resultados. Só lamentei que os repórteres Alexandre Salvador e Luiz Felipe Castro não tenham perguntado sobre as preleções de Tite. Será que ele usa computador e projetor?

Raio gourmetizador

Moda é moda. Só saberemos se vale mesmo a pena com o passar dos anos. Fica o que presta. O resto desaparece.

Agora a moda é comida gourmet. Para que comer brigadeiro pura e simplesmente? Vamos adicionar uma pitada de pimenta embebida em licor, chamar isso de redução ardente e voilà! O brigadeiro passa a ser gourmet - uma espécie de senha para cobrar, no mínimo, o dobro do preço.

Não há comida que escape incólume. Churros, tapioca, cachorro quente, brigadeiro, e por aí vai. Uma unidade de churros gourmet custa uns 7 reais. Uma tapioca de carne de sol na nata, só porque vem com um copo desses de cafezinho de um creme pastoso de cheiro verde, custa 24 reais. Se for de camarão com catupiry e umas ervas por cima e um copinho nos mesmos moldes de pasta de tomate seco, o preço sobe para 33,50. Um cachorro quente com uma fatia de picanha, 20 reais. 

Vou ser muito sincera: para mim tudo não passa de uma boa desculpa para cobrar 3, 4 vezes o preço normal de determinada comida. Aplica-se uma espécie de raio gourmetizador e adeus bolso do consumidor. Até a descrição do cardápio é feita para impressionar: redução de num sei o que lá com outra firula qualquer. Me poupe! Essa é mais uma faceta do discurso enganador. Em vez de dizer logo que a tapioca levou vinagre e rapadura, melhor afrontar o consumidor com termos químicos e falar que houve uma redução de acetato com mel de engenho. Quanto refinamento! Como a maioria das pessoas estão muito preocupadas com o que os outros vão pensar a respeito delas, é melhor reverenciar a descrição refinada e nem questionar o que seria aquilo. Afinal, só um ignorante não saberia. E assim você paga quase 40 reais numa tapioca (sim, há os 10%!) achando que redução de acetato com mel de engenho é algo muito superior a vinagre e rapadura.

Aqui vai o conselho de quem é fã de comida saborosa: fuja do raio gourmetizador porque é cilada! Em 99% dos casos não vale o que se paga. Seu bolso agradecerá.