domingo, 4 de junho de 2023

25 anos

Há 25 anos, em 4 de junho de 1998, Natal e o Rio Grande do Norte se pintavam de vermelho para uma conquista impensável até então.

Com um Machadão entupido, o América ofensivo do irrequieto técnico Arthurzinho meteu um 3x1 no Vitória de Petkovic e cia. para reverter a  vantagem adversária de 2x1 obtida no jogo em Salvador e levantar a belíssima taça da Copa do Nordeste, competição que ousou alçar os clubes nordestinos a outros voos. 

E ali o RN conheceu sua primeira e única participação em competição oficial da Conmebol, a confederação que cuida do futebol sul-americano. Na época, a própria competição era chamada de Conmebol; hoje lhe chamam Taça Sul-americana. 

Já devo ter relatado inúmeras vezes aos longo destes 25 anos a minha luta para chegar até o Machadão. Primeiro que eu dava aula na época recém-saída da adolescência e ainda universitária até às 20h30 daquela quarta-feira na Cidade Alta, ou centro da cidade, e o jogo começava às 20h30. Foi minha chefe, também americana, sem que eu pedisse, que me autorizou a combinar com os alunos para sair às 20h15 e compensar esses 15 minutos mais cedo na aula seguinte.

O táxi ficou preso no enorme engarrafamento dos arredores do estádio. Uma multidão se fazia presente. O taxista deve ter xingado até a quinta geração da minha família por termos o deixado ali para seguirmos a pé. Paguei, pedi desculpas, mas era o jogo mais importante da minha vida e eu queria ver pelo menos um bom pedaço do 1.° tempo. 

Era um encanto ver a arquibancada e ver o time em campo. Nem percebi que a zaga era absolutamente improvisada com dois meninos, Lima, que era volante da base, e André, que jogara o estadual pelo Parnamirim. Os titulares, muito mais experientes, estavam de fora por contusão/cartão.

Moura, Carioca e Biro-Biro deram cara àquela final. Acho que a demolição do Machadão começou ali de tanta gente se espremendo na arquibancada e fazendo o estádio tremer do início ao fim do jogo.

No apito final, nós e uma galera queríamos chegar ao gramado pelo portão dos árbitros. O funcionário Ricardo avisou que o olímpico estava aberto, que não poderia nos deixar passar por ali. A futura advogada desconfiou na hora e a galera que já partia para o portão indicado voltou. A cara dele de desespero terminou me convencendo de que era verdade. E assim a multidão foi para o portão olímpico e a festa ganhou um tom inesquecível.

Acho que eu e Janaina éramos as únicas mulheres no gramado. Lembro de Wanderley, meu primeiro artilheiro favorito e que Chico Inácio apelidou de "o artilheiro de Deus" por conta do título estadual de 96 (depois eu conto essa história), todo envergonhado por estar só de cueca (a torcida levou todo o resto) e dar de cara com a gente lá. 

Era tanta alegria espontânea. Todo mundo sorria para o nada. De repente, um grito na multidão: "Professora". "Não é possível", pensei. De novo: "Professora". Por fim, o golpe fatal: "Teacher". Era um aluno que o tempo levou de minha memória o nome, mas não o rosto, que estava em cima da cobertura do banco de reservas do América comemorando aquela conquista. Lembrou-se a tempo que eu cobrava de meus alunos de inglês que me chamassem de Raissa mesmo, ou de teacher, mas jamais de professora (praticar é preciso).

Também já devo ter relatado inúmeras vezes a nossa subida (eu, Janaina e Fernando) no carro de bombeiros com os jogadores. O supervisor César queria nos retirar de lá, mas quando o craque e dono do time Moura viu a cena, interrompeu na hora: "Deixe minhas amigas aí que elas vão conosco". Ele nos conhecia desde a Pousada do Atleta. Sempre foi um craque dentro e fora de campo. Enfim, um amor de pessoa. 

Do Machadão até a sede social, foi só diversão mesmo com muita chuva caindo. A Prudente de Morais ficou entupida de gente, carros, motos. Lembro até de Wanderley aperreando Paloma com umas paqueras num buggy que vinha quase emparelhado com o carro de bombeiros. 

Chegando à sede não tive coragem de entrar. Era muita gente desde a rua. Tudo lotado. Pegamos um táxi de volta, extasiados com tanta felicidade.

Ainda tenho aquela camisa, a única Kappa branca do América, que foi utilizada na final. Foi só para a Copa do Nordeste. Na Série A do ano anterior, Kronos; daquele ano, Penalty. Ficou marcada na memória de quem viveu aquele ano mágico de tantas goleadas e vitórias inimagináveis.

Há 25 anos éramos felizes e sabíamos. 

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