Quando sonhamos tudo podemos. Comprar sem orçamento, deslocarmo-nos em poucos segundos por distâncias assustadoras, morrer e ressuscitar, curarmo-nos sem necessidade de remédios ou hospitais, voar... Quando sonhamos coisas boas, naquele momento, a realidade é suplantada. Que pena quando acordamos e damos de cara com a dura vida.
Assim também é quando sonhamos acordados. Projetamos conquistas futuras. Inicialmente tudo são flores. À medida em que caminhamos em busca do sonho, de sua conquista, deparamos com percalços pequenos no início, bem mais sofríveis depois.
Escrevo estas malfadadas linhas (certamente serão alvo de críticas de ambos os lados, mas não me furto de expor o que penso - é do meu feitio) impressionada com os últimos acontecimentos envolvendo o América. Desde que o Abc construiu em parceria com a Ecocil o seu estádio, surgiu em alguns americanos um desejo desenfreado de ter um estádio próprio. O clube que resolvera construir um CT quando da venda da Pousada do Atleta ao Hiper Bompreço (sim, jovenzinhos, o América treinava ali praticamente no cruzamento da Av. Engenheiro Roberto Freire com a Av. Ayrton Senna), por sinal, na administração de Eduardo Rocha, e que nunca ligara para estádio, já que tinha o Machadão para chamar de seu, passou a perseguir a construção de um estádio próprio.
Mas nada no América caminha sem a bênção dos Rocha. Enquanto José Rocha foi contra, de nada adiantaram inúmeros projetos e apelos de iniciativa de jovens torcedores (participei como ouvinte de uma das reuniões) para que o tal sonho fosse concretizado. Com a queda do Machadão, Zé Rocha mudou de opinião e agora parece que a Arena América vai. Este é o sonho: um estádio moderno, nos moldes da Fifa, bem localizado, e com capacidade para 22 mil expectadores, e que será explorado comercialmente em dias normais. Perfeito!
Qual é a realidade? Qualquer construção custa caro e praticamente nada neste país segue o orçamento inicial. Quem já realizou reforma em casa bem sabe o que estou dizendo. A obra nem sai no prazo nem cabe no orçamento previsto. A Arena América, que já teve vários números divulgados como sendo a capacidade inicial (desde 2.500 aos atuais - previstos - 6.500 ), terá que ser construída em etapas e aqui está o pulo do gato. Não adianta apenas doação de cimento, areia, prego, tábua, instalações hidráulicas, elétricas, etc. É preciso dinheiro para pagar a mão-de-obra especializada.
Em entrevistas, Zé Rocha afirmou que o investimento no primeiro módulo (será que terá mesmo capacidade para 6.500 lugares?) será todo proveniente da venda de camarotes e cadeiras. E depois? O que será negociado para a construção de tantos módulos quantos bastem para que seja atingida a capacidade total? Quem tem coragem de afirmar quando o América poderá sediar um jogo de Série B (10.000 no mínimo) em sua Arena? E um jogo de Série A (15.000 no mínimo)? E uma semifinal da Copa do Brasil (iluminação adequada e 15.000 sentados)?
Pois bem. Agora mesmo o América sofre com o deslocamento de aproximadamente 60km numa BR duplicada para jogar na acolhedora Goianinha. Público definhante mesmo tendo o América como candidatíssimo a um acesso à elite da Série A no ano passado. Nem o clássico de campeões do Nordeste com o Vitória empolgou mais torcedores a empreenderem uma viagem de 120 km + outros gastos.
Que saudade do Machadão! Acessado por todas as linhas de ônibus da cidade (passagem a R$ 2,20), até a pé eu chego lá. Sem traumas com os horários dos jogo, porque até no segundo tempo eu chegava. Atualmente, se o jogo não começar pelo menos 45 minutos depois de meu horário de trabalho ou compromisso, adeus! Afinal, levo mais tempo no carro do que dentro do estádio.
Some-se a isso que todo bar transmite os jogos dos times de Natal. Frequentar estádio virou coisa de apaixonado (mais para louco mesmo) endinheirado. No caso de Goianinha, então, frequentar estádio é caríssimo, distante, cansativo. E o aumento dos combustíveis só piorou as coisas. Nem vou falar dos horários loucos da Cbf.
Esclareço que opino pelo que é de conhecimento público, vez que não vi, nem li documentos, nem conversei diretamente com os envolvidos. Dito tudo isso, vamos à polêmica! A OAS teria oferecido patrocínio de 1 ano e meio ao América para que este realize pelo menos 50% de seus jogos como mandante por ano na Arena das Dunas durante 15 anos. O empresário que resolveu investir num estádio no meio do nada em termos de futebol (Ceará-Mirim) teria oferecido o Barretão para que o América lá jogue sem custo durante 5 anos. E a construção da Arena América estaria a todo vapor (?!). Onde está a polêmica? As cassandras dizem que se o América fechar com a OAS não constrói a Arena América. Será?
Volto às minhas perguntas: quando a Arena América terá capacidade de receber um jogo pelo menos de Série B? Até lá, o América vai continuar definhando em Goianinha com arquibancadas inutilmente alugadas para fechar a capacidade do estádio? O bom senso diz que não. Voltemos ao Barretão. Se o América jogar lá, vai matar o sonho da Arena América? Qual a solução, então? Licenciar-se até que a Arena América esteja pronta?
Fico impressionada como coisas simples não são resolvidas com bom senso no América. Vou ser dura agora: a Arena América NUNCA terá os bons públicos que o Machadão teve. É o mesmo que ocorre com o Maria Lamas Farache - localização é tudo! E o Machadão, agora Arena das Dunas é imbatível neste quesito. Além disso, a própria capacidade máxima já indica: um público como o de América x Brasiliense em 2010 (jogo de rebaixamento) e América x Santo André em 2006 (jogo de acesso), para ficar em jogos memoráveis mais recentes, com mais de 28 mil pessoas, não se repetirá jamais na Arena América.
Quando tiver capacidade para 6.500 pessoas, a Arena América não poderá receber jogos da Série B. E aí? A melhor solução em termos de público é jogar em Ceará-Mirim, cujo acesso é pior do que o de Goianinha, jogar em Goianinha com trambolhos inutilmente alugados, jogar no moderno e bem localizado Arena das Dunas ou se licenciar até que um dia o estádio próprio tenha capacidade para pelo menos 10 mil?
Senhores conselheiros, família Rocha, Senhor Presidente do América, por favor, tenham bom senso. Joga-se em Goianinha nos jogos com menos de 10 mil de capacidade (estadual e primeiras fases da Copa do Brasil) e joga-se a Série B no Barretão até a virada do ano. Construída a Arena América (fase inicial) e a Arena das Dunas (dezembro de 2013), joga-se na Arena América nos jogos com menos de 10 mil de capacidade (estadual e primeiras fases da Copa do Brasil) e na Arena das Dunas a Série B. Esqueçam essa besteira de Barretão em 2014 ou nos anos seguintes!
Tomem como exemplo o que ocorreu com a torcida do Abc, que nunca mais lotou um estádio devido à distância. Não levem o América com suas próprias pernas para o mesmo caminho. Que esses anos sem Machadão tenham servido de lição. Que venha a Arena América! Mas atentem para a realidade de que uma construção de tal porte leva tempo e dinheiro e não sairá a toque de caixa. Vamos assumir a Arena das Dunas também como nossa casa. O América é grande e não merece públicos de 1.000-2.000 presentes. Permitam o seu engradecimento! Não matem o Orgulho do RN!