Essa palavra "carestia" vivia na boca da minha mãe nos anos 80. Tomei abuso a ela e a "supérfluo", que sempre a acompanhava. Eu, na inocência da minha infância, quando ia ao supermercado com mamãe para as compras, pedia coisas como iogurte e biscoito recheado e ouvia de volta uma negativa e a justificativa de que tais coisas constituíam "supérfluo" e não podiam ser compradas por nós naquela "carestia". Tempos difíceis que me marcaram para sempre.
Hoje sou eu que faço as compras e preciso lidar com os conceitos dolorosos de "carestia" e "supérfluo", especialmente o primeiro.
Abri hoje a newsletter sobre mercado da Folha de S.Paulo e lá estava o comentário sobre a alta dos alimentos na pandemia e a campanha nas ruas contra a "carestia".
"Carestia" é um gatilho para mim, para usar um termo tão em voga nos dias atuais. Talvez seja para outras pessoas que viveram os anos 80 e a hiperinflação. Dá até calafrios.
A newsletter trouxe a informação do IBGE de que o Brasil teve inflação de 5,2% nos 12 meses oficiais de pandemia de Covid-19 por aqui, a mais alta desde janeiro/2018. Só que alimentos tiveram aumento 3 vezes maior no mesmo período (15%) em que cozinhar e se alimentar em casa virou regra. E olhando para itens específicos, a pancada foi muito maior, como óleo de soja (87,89%), arroz (69,
8%), batata (47.84%) e leite longa vida (20,52%).
Se olharmos para os grupos de alimentos, a coisa piora, com a disparada de cereais, leguminosas e oleaginosas (57,83%), óleos e gorduras (55,98%), tubérculos, raízes e legumes (31,62%), carnes (29,51%) e frutas (27,09%). Ou seja, nada escapou da "carestia".
Nos anos 80, tínhamos uma ditadura militar já moribunda a nos assolar. Agora uma pandemia totalmente descontrolada nos ceifa a vida e a saúde, de novo com militares no poder, pelo menos em cargos fundamentais.
Ah, de fizéssemos melhor uso das aulas de História... Talvez "carestia" não voltasse para me assombrar diariamente.
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