sexta-feira, 23 de setembro de 2011

O STJD e suas polêmicas

Brasil, o país do carnaval. O ano inteiro. Em todas as áreas. O que importa mesmo é ir levando ao som dos batuques. Amanhã a gente pensa no depois. Parece até que há um placa daquelas de mercadinho em cada esquina desta terra tropical: "Fiado só amanhã". Só que, no caso, os dizeres são diferentes: "Seriedade só amanhã."

Poderia levar uma vida inteira citando a aplicação prática dos dizeres da plaquinha. Mas seria chato e interminável. Levaria um outro tanto para citar essa mesma aplicação quanto ao futebol. É melhor falar do assunto do momento: o STJD e a Série C.

Como diz Arnaldo César Coelho, a regra é clara. A Constituição Federal determina em seu artigo 5.º, inciso XXXV, que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Durante muito tempo, isso parecia não se aplicar aos julgamentos desportivos. Imaginar que a CBF e assemelhados estariam acima da lei era negar o estado de Direito. Criou-se então a regra de que é preciso primeiro esgotar a instância desportiva.

Mas o que é a instância desportiva? É a seara onde se discutem as questões a respeito das querelas que envolvem as competições. Punições a clubes, atletas, dirigentes.

Pois bem. Dois clubes acreanos (entre eles, o Rio Branco) estavam ameaçados de não obter renda em suas primeiras partidas no campeonato brasileiro por ausência de aprovação do estádio Arena da Floresta. Os laudos apontavam que o estádio não reunia condições de segurança/conforto para o público assistente. O Ministério Público então remete ofício à CBF determinando a interdição do estádio. A CBF informa à federação local que o estádio só poderá ser utilizado com os portões fechados. Autoridades resolvem entrar com ação cautelar preparatória (queriam um TAC) com laudos que comprovam que o estádio teria condições para apenas 10 mil. O juiz de plantão entende que os requisitos estão presentes para a concessão da liminar e a CBF é intimada para permitir a realização dos jogos no estádio com a nova capacidade (10 mil pessoas).

O caso vai parar no STJD, esse mostrengo recheado de decisões que mais parecem saídas de disputas entre torcedores numa mesa de bar através daquele jogo em que é preciso adivinhar quantos palitinhos de fósforo todos têm na mão.

Lá, parece óbvio que o Rio Branco desafiou a CBF sem ter esgotado a instância desportiva. Assim, votam 2 auditores. O Rio Branco é excluído. A vida segue. Até que um recurso do mesmo clube consegue efeito suspensivo no mesmo STJD. Volta o Rio Branco. Agora são Luverdense e Araguaína que querem a suspensão da suspensão, ou seja, a volta da decisão original.

Sabem qual é a grande polêmica? É que o STJD não é um tribunal de verdade. Não se requer notório saber jurídico de quem ali milita. As indicações são políticas. Imaginem o que isso quer dizer no mundo do futebol... Então o STJD não gosta muito de se meter no trabalho de interpretar as regras. Basta ler o que está escrito, sem atentar para o sentido e a finalidade das regras aplicadas em sintonia com o restante das regras em vigor.

Interdição de estádio por falta de segurança baseada em laudo técnico é realmente uma questão desportiva?      O Rio Branco não foi punido com a perda de mando de campo. O que houve foi uma constatação por parte da autoridade competente (Ministério Público, conforme Estatuto do Torcedor) de que o estádio não atendia aos requisitos para que ali houvesse um evento com presença de público. Era preciso mesmo esgotar a instância administrativa numa questão resolvida por laudos técnicos e que não dizia respeito a punição alguma? Vejamos se o STJD enfim enxergará a diferença.

Mas o melhor (ou o pior) mesmo é o fato de o STJD ter dado efeito suspensivo para lá e para cá, mas não ter empreendido a suspensão do campeonato. Ora, como ficam os torcedores que pagaram ingresso para ver jogos que podem simplesmente não ter valor algum se Luverdense e Araguaína conseguirem o que querem? E os gastos de quem viajou para jogar (Rio Branco e América) para um possível amistoso? O mais trágico (ou cômico, nesse eterno carnaval) é que o órgão julgador desportivo nem se deu ao trabalho de marcar uma data para resolver definitivamente a questão. Para quê? Ninguém está com pressa mesmo!

Mal visualizamos o estrago que a omissão do STJD já vem causando, eis que surge mais uma questão envolvendo a Série C: a palhaçada no PV de Fortaleza e CRB. O Campinense juntou vídeos, depoimentos e pediu julgamento a respeito. Eis que a procuradoria do STJD prepara a denúncia contra o Fortaleza, contra o árbirtro, contra alguns jogadores e...cadê o CRB? Porque, se houve "arrumadinho" para favorecer o Fortaleza, o vídeo deixou claro que o CRB fez parte. Nenhuma linha a respeito do CRB. Isto pode indicar que nada mudará. Principalmente porque a denúncia não pede exclusão do campeonato dos clubes envolvidos, mas apenas que uma nova partida seja disputada. Ah, tá! O CRB já classificado (Campinense venceu o Guarany) vai colocar seu elenco titular numa disputa feroz contra o Fortaleza, que terá muita dificuldade em fazer os 4 gols necessários à sua manutenção.

Recásens Siches já defendia que o Direito não pode se afastar da lógica do razoável. A aplicação de uma regra não pode produzir um caos maior do que a sua não aplicação. Se o STJD enxergou que o Rio Branco tinha um aparente direito sendo obstruído por decisão de uma de suas comissões, que por sua vez constatou exatamente o contrário, caberia a suspensão do campeonato e marcação imediata dos julgamentos que envolvessem a questão prioritariamente sobre a pauta já agendada (isso existe no STJD?). Tudo decidido sem causar qualquer prejuízo ao campeonato, que seria atrasado no máximo em uma semana.

Mas isso seria o mundo perfeito. No mundo real, ou o STJD se envolve em um trabalho efetivo para tornar suas decisões dignas de serem classificadas como jurídicas e em prol do desenvolvimento da área que lhe cabe, ou estaremos em pleno século XXI e convivendo com decisões que dividem as partes entre os amigos e os inimigos do rei, como ocorria em priscas eras.

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