A cada dia, a Lava Jato vai se aprofundando nas entranhas da politicagem brasileira. De início, os ruídos de sempre dos velhos discursos coronelistas: "isso é intriga da oposição", "a investigação é meramente política" e por aí vai.
O Brasil vive um momento ímpar. É hora da nação brasileira se olhar no espelho e reconhecer que o que esta belíssima investigação vem revelando é apenas reflexo de uma sociedade calcada na esperteza, no lucro fácil, no "você sabe com quem está falando?" e "todo mundo faz, por que eu não vou fazer?".
Esses investigados todos não chegaram ao poder de paraquedas, não. Foram eleitos. Mas não foram alienígenas os eleitores, não. Fomos nós: eu, você, o juiz, o ambulante, todo mundo.
Será que ainda vamos aceitar que políticos sejam eleitos na base do "rouba, mas faz"? Será que ainda vamos votar por pura tietagem em X ou Y e deixar para lá o trabalho sério de instituições como Polícia Federal, Ministério Público levados a julgamento no Poder Judiciário?
Ninguém começa roubando R$ 1 milhão. O apreço pelo ilícito começa de pequenas afrontas à lei: um troco a mais indevidamente recebido, um livro emprestado convenientemente nunca devolvido, um estacionamento proibido, uma contramão quando ninguém está vendo, uma furada de fila aqui, uma carteira de estudante falsificada ali... De repente, as coisas vão evoluindo no melhor estilo "a ocasião faz o ladrão", e assim são forjados os corruptos de corpo e alma.
Não podemos aceitar que política seja uma coisa feita apenas por corruptos e assim votar em candidato que tem só uma "denunciazinha" frente aos outros. A política tem que ser dos que têm espírito público, que nasceram não com o rei na barriga, mas com a missão de servir a um povo. É disso que precisamos: servidores, não nobres encastelados nas delícias do poder.
Mas não é a nossa realidade. Pobres se elegem e viram milionários da noite para o dia. Pena que o milagre não se repete para o restante da população.
Eis o momento ímpar que a Lava Jato proporciona: roubou? Cadeia. Dinheiro sendo carregado dos bolsos dos canalhas de volta aos cofres nacionais. O desespero da bandidagem já lançou a canalhada toda num salve-se quem puder.
Este momento ímpar pode ser a grande virada da nação brasileira. Chega de ser a nação que defenestra honestos como manés, idiotas que cumprem a lei quando ninguém mais cumpre. Sejamos a nação que repudia malandros, que exalta a honestidade e a ética como valores a serem perseguidos, mesmo sabedores de que não somos perfeitos. Não somos. Mas seremos bem melhores quando desprezarmos essa mania de ter a desonestidade como exemplo de inteligência.
Queremos eleições já! Pois bem. Lutemos por isso. Mas não vamos repetir o padrão do "rouba, mas faz". Queremos um novo padrão. Queremos servidores do público, não saqueadores oficiais. Comecemos por nos interessar pela ficha dos candidatos, inclusive dos vices. Prestemos mais atenção no voto dado a vereadores, deputados, senadores, sempre os primeiros a fugirem da memória, mas os mais importantes do ponto de vista de estancar a corrupção. Acabemos com a ideia de que "toma lá, dá cá" é algo corriqueiro. Ainda que seja, é errado e deve ser condenado.
Chegou a hora de definir que tipo de nação queremos ser: uma em que só políticos enriquecem ou uma em que o bem geral seja de fato perseguido pelos integrantes do poder público.
Isso começa com nossas atitudes diárias. Busquemos a honestidade e a ética. Assim poderemos ter eleitos que reflitam essa nova realidade que tanto dizemos ser aspiração coletiva.
E que siga a Lava Jato pelo tempo que tiver que durar até que a ficha desse povo caia rapidamente de que não podemos prosseguir desse jeito.