O texto é do jornalista da DW (Deustche Welle) Joscha Weber, deliciosamente republicado na Tribuna do Norte deste domingo e faz parte de reportagem bem detalhista sobre o novo escândalo em que se envolveu a FIFA e que foi denominado Fifagate e como Joseph Blatter tem conseguido passar incólume em 17 anos de mandato, cuja leitura eu altamente recomendo. Vejamos a parte que destaquei.
'Seppocracia'
Tudo é relativo na Fifa. Até mesmo o tempo. "Acho que o tempo que passei na Fifa não é longo", disse Joseph "Sepp" Blatter antes de sua reeleição no 65.º congresso da Fifa. Lembrete: este homem está há 40 (!) anos na entidade máxima do futebol mundial. Em 1975, ele começou como diretor de programas de desenvolvimento. Naquela época, o seu adversário derrotada na disputa pela presidência da Fifa, o príncipe jordaniano Ali bin al-Hussein, não era nem nascido. E não somente neste ponto Blatter tem uma percepção bem própria das coisas. Anos de corrupção por parte de dirigentes do alto escalão da Fifa? Para Blatter, apenas casos isolados. Indignação pública com o enésimo escândalo na Fifa? Sujeira para a qual a Fifa está sendo arrastada. Assumir a responsabilidade política pelo caso? "Sim, assumo", disse Blatter - mas renunciar por causa disso, nem pensar.
Blatter constroi o seu mundo do futebol do jeito que lhe agrada. E sua "família", como ela chama a Fifa, de fato aceita isso. Para quem vê de fora, é algo completamente incompreensível. Mas, dentro dessa família, as regras simplesmente são outras.
Há quatro anos, estive em Zurique para o congresso da Fifa em 2011. Na época também havia críticas públicas a Blatter e à Fifa - não tão contundentes como as de hoje, mas claramente audíveis. No interior do salão, porém, era tudo paz e amor. Somente a Federação Inglesa de Futebol (FA) ousou tecer algumas críticas a Blatter. Na época, pensei: um mundo paralelo, essa Fifa. Hoje tenho certeza: a Fifa é um universo paralelo.
"Não precisamos de uma revolução, precisamos de evolução", sustentou Blatter, com toda a seriedade, diante dos dirigentes, oferecendo-se como o nome inovador para uma "Fifa forte", que precisa ser protegida (por ele) de interferências políticas. Como é que é? Justamente ele quer reformar um sistema que tem sido moldado e influenciado por ele mesmo, durante décadas? Assim, como se ele não tivesse nada que ver com essa Fifa que está aí? Desconexão com a realidade é elogio num caso como esse.
E, mesmo assim, o mundo bizarro da Fifa é bem real. Um mundo onde um presidente em exercício provavelmente nunca deixará o cargo derrotado numa eleição porque mantém o seu eleitorado com cargos e doações de vários milhões de dólares. Um mundo no qual há influentes e ricos "coletores de votos", como o xeque Ahmad al-Sabbah, que, em troca de sua lealdade a Blatter, tem as melhores cartas para ser escolhido seu sucessor em quatro anos. Ambos trocavam abraços e demonstravam no palco do congresso a certeza da vitória - antes mesmo da eleição. A Fifa, uma democracia? Está mais para uma monarquia com sucessão hereditária. Uma "Seppocracia". Depois que ele finalmente foi novamente entronado, digo, eleito - porque seu [adversário] desistiu de um segundo turno -, Blatter festejou a si mesmo: "Let's go Fifa, let's go Fifa! Eu sou o presidente de todos vocês."
Esse foi o texto. E eu acrescento que qualquer semelhança com a política brasileira, inclusive no futebol, é mera coincidência.