Hora de continuar o relato da viagem do início do mês.
Ainda sem dormir desde a saída de Natal na noite anterior, era chegada a hora de pegar o carro na Localiza do Aeroporto de Cumbica e zarpar rumo ao Santuário Nacional de Aparecida. Janaina é mais do que devota. Ela tem uma relação especial com Nossa Senhora Aparecida. A intimidade é tanta que a chama de minha neguinha. E eu não podia perder por nada nesse mundo esse encontro. Como a viagem era bem corrida, coloquei logo como primeiro destino após a chegada a São Paulo.
Acostumada a andar pelas estradas da Flórida nos Estados Unidos, fiquei absolutamente encantada com as estradas privatizadas de São Paulo. A primeira que peguei foi a Dutra, ou Nova Dutra como o consórcio que a administra a chama. Não há um só buraco. Duas faixas de absoluto prazer em dirigir e com velocidade majoritariamente de 110 km/h. Sono devidamente espantado. E, ao contrário de quando viajo a João Pessoa, um lindo sol nos acompanhou o caminho inteiro.
Passamos por 4 postos de pedágio. R$ 3,80 + R$ 3,80 + R$ 6,10 + R$ 13,80, se a memória não me trai. Por que aumenta? Só Jesus sabe. E os postos, especialmente os dois últimos antes de Aparecida são muito próximos. É meio irritante ter que catar moedas a cada tantos quilômetros. Ponto negativo para a Localiza, que deveria alugar seus carros já com o Sem Parar, exatamente como a Alamo faz na Flórida com o Sun Pass. A conta vem no cartão de crédito.
O atendimento nos pedágios é cordial. Fazia frio e fiquei com pena das mocinhas de mãos geladas - luvas atrapalhariam a cata das moedas. Elas sempre têm o troco correto. Num dos postos de pedágio, perguntei se carro alugado não vinha com o Sem Parar. A moça respondeu que não, mas que eu poderia adquirir um, e como ele era vinculado ao CPF, associar a placa do carro alugado enquanto assim fosse. Deveria ter feito isso...
A Dutra é uma reta só, muito bem sinalizada, à lá Turnpike e I-95 da Flórida. Mas a paisagem de serra é bonita e dá gosto passar por ela.
Por volta de 2 horas, lá estávamos pegando a saída para Aparecida. Velocidade bem reduzida com trechos de 50 km/h. O GPS não errou nadinha. Quando chegamos à entrada do estacionamento do Santuário, um rapaz com camiseta "Posso ajudar?" se aproximou e nos ofereceu umas pulserinhas "abençoadas" do Santuário e umas imagens de oração. Sugeriu uma doação. Que ia aumentando à medida que nos aproximávamos da bolsa. A felicidade era tanta em estar ali que não vi nada demais em dar um dinheirinho pelas pulserinhas e imagens.
O estacionamento custa R$ 15/dia. Para nossa sorte, é possível dizer que o Santuário estava vazio naquela quarta-feira fria. Com as dicas de Michele, que mora há alguns anos na vizinha Guaratinguetá, corremos para ver logo a própria Nossa Senhora Aparecida, já que uma missa acontecia no momento (a última da manhã).
Umas cinquenta pessoas estavam ali contemplando a neguinha de Janaina. Alguns integrantes da Igreja (monges talvez) até ajoelhados estavam. Todo mundo queria uma foto. Todo mundo respeitando o espaço alheio. Tudo na maior tranquilidade. Janaina queria só olhar para ela, eu que insisti para fotos. E assim terminei ajudando algumas senhorinhas que também queriam uma recordação semelhante.
Vou dizer, a santa em si não me impressionou muito em relação ao que vemos na TV, mas a Basílica, uau! A TV passa longe de retratar o que é aquele lugar. Lindíssimo! Cheio de detalhes a cada parte. Janaina começou a chorar ao dar o primeiro passo ali dentro. E eu, que não sou muito religiosa, mas sou uma boa manteiga derretida, também não consegui me segurar em alguns momentos.
Descemos para melhor ver o teto e nos juntamos à missa. O padre chamou todos para próximo do altar, algo impensável quando a Basílica está cheia. Iria dar sua benção aos devotos e seus objetos. Todos rezaram juntos. Nessa hora, registrei o momento por mim mais aguardado: o choro de Janaina com os cânticos à Nossa Senhora. Posso dizer que viajei de Natal só para isso. Ali ganhei a viagem.
Ao contrário de outro viajantes, nós não queríamos turistar em Aparecida, embora seja também recomendável. Há um teleférico que leva a uma estátua enorme dela em cima da serra. Há a Basílica antiga. E outros detalhes. Ficamos só no prédio novo, que tem 16 andares. Fomos ao mirante e de lá vimos tudo, até o famoso Rio Paraíba. Descemos para o museu - fraco na minha opinião.
Eu queria assistir à missa do meio-dia, mas o cansaço e a fome de quem comera pouco para mais de 24 horas no ar não deixaram. E essa missa foi ainda mais tranquila: vi apenas umas 5 pessoas. Mas o corpo e a mente não permitiam mais.
Voltamos para o carro e ajustamos o GPS para um restaurante em Guaratinguetá. A mente já estava tão desacertada que digitei um pensando que ia para outro. Somente quando desci do carro no destino foi que me toquei do erro cometido. É que a mineira Michele nos indicara dois locais: Luciana Slow Food e Santo Pastifício. Eu fiquei mais atraída pelo primeiro, mas no segundo havia uma cerveja artesanal para Janaina conhecer. Na hora do cansaço, o ato falho nos levou ao Luciana Slow Food. Pense num erro acertado! O local fica no centro histórico de Guaratinguetá, com aquele ar da nossa Ribeira - todo centro histórico tem ar da nossa Ribeira. Claro que me senti em casa. O local tem um que de rústico. R$ 22 de buffet livre (bebidas não inclusas). Que comida absolutamente maravilhosa! Repeti tudo, coisa que não faço. Até o churrasco repeti, que há tempos não comia tão divino. Amei a dica de Michele e recomendo a todos que forem a Aparecida: vá almoçar no Luciana Slow Food em Guaratinguetá (a 15 minutinhos da Basílica). Passa por um pedágio novamente, mas é totalmente válido.
Comida no bucho, pé no mundo. Chega deu uma dor de sair dali de tão agradável que é, mas era hora de subir mesmo a serra rumo a Campos do Jordão. Subir a serra num carro de motor mil seria um grande tirateima para mim, que morro de medo de altura.
O GPS nos levou por um caminho menos famoso, por dentro de Pindamonhangaba, ou Pinda, como carinhosamente chamam todos por ali. Nada de só serra: gente, cachorros, casas... Adorei! Entra aqui, volta ali, depois o caminho ficou mais reto, as casas e escolas foram ficando para trás e cada vez mais natureza foi nos fazendo companhia.
A previsão sempre fica em torno de 1h30, 2h. Quando o caminho ficou mais parecido com viagem mesmo, Janaina percebeu que a gente andava, andava, andava, mas o GPS não saía da previsão de que faltavam 53 minutos para a chegada no destino. O telefone da Localiza (o GPS é um Samsung) estava travado. Entenderam por que não gosto da marca? A co-piloto entrou em desespero. Por incrível que pareça, eu estava tranquilíssima: tinha certeza de que o caminho era aquele mesmo. Parecia o caminho para Barra de Cunhaú. Não tinha como não ser ali.
Desligamos o telefone e o religamos. Nada do sinal da Vivo. Disse para Janaina ajustar o Maps do celular dela, com sinal Claro. Pronto. Problema resolvido. Em poucos minutos, os dois Maps estavam funcionando e voltamos a utilizar apenas o da Localiza.
Quando a subida começa, não tem mais jeito. É praticamente só curva e pé embaixo. O meu medo de altura não permitia carro algum acumulado atrás de mim: encostava no acostamento para permitir a passagem dos motores mais potentes. E nesse ritmo, íamos vendo as placas da altitude passando - 900m, 1.000m, 1.200m... 1.600m foi a última que vimos. Olhar para a direita embrulhava o estômago: um deslize e cairíamos só o projeto lá embaixo. Ainda bem que a estrada é muito boa, até acostamento tem. Pouco tempo depois, chegamos ao pórtico de entrada, mas nada de foto. O cansaço nem deixou pensar em procurar uma vaga para estacionar.
De cara, na comparação com Gramado, Campos do Jordão perde. Mas essa impressão será completamente desfeita mais à frente. Atravessamos a cidade em busca da Matsubara Pousada. O GPS nos deixou no estacionamento. Tive uma boa impressão do local: muito aconchegante.
Ao abrir a porta, o frio deu as caras mesmo. Carregamos as malas até a recepção, onde uma moça com quimono nos acolheu e nos entregou fichas para preenchimento. Chave tipo cartão, o quarto ficava no mesmo andar da recepção. Ufa! O cansaço de tantos quilômetros rodados e da noite sem dormir bateu com força. O quarto estava um gelo só. É que o aquecedor entra em funcionamento de forma automática assim que a temperatura cai para 12°. Mas desde os 16° eu já batia o queixo. Fiquei toda encolhida sem nem coragem de trocar de roupa. Depois de mofar por umas 2 horas sem conseguir dormir, parti para o ataque: banho.
Tirar a roupa naquele frio foi um enorme desafio. Pisar no chão gelado então... E até descobrir o ajuste da água a mão sofreu para conferir a temperatura. A aguinha quente foi como um bálsamo. Até a dor de cabeça passou. E olha que em Natal só tomo banho gelado! Totalmente revigorada, era hora de ir conferir as atrações de Capivari para jantar. A pousada tem traslado gratuito para lá. Ótimo. Em pouco tempo chegamos ao local.
Antes disso, a recepcionista, ciente de que éramos nordestinas, não confiou nas nossas duas blusas de lã cada. Insistiu para que fôssemos buscar um casaco. Mal sabe ela que só viajamos para ver frio. Para não sermos muita chatas, fomos buscar casacos. Janaina até tem um adequado; eu, só o meu estilo Gap. Levei no braço, just in case.
Passeamos um pouco para descobrir os preços padrão serra turística de Campos do Jordão. Terminamos nos engraçando com o 1.° andar de uma pizzaria, a Maná. Descolamos um desconto com o funcionário de outro restaurante. Valeu a pena. O pessoal é meio estressado lá, mas até que fomos bem atendidas e a pizza de lombo canadense estava boa. E o frio leva até quem não bebe a tomar algo com álcool. Uma taça do vinho da casa mesmo ajudou. Só não gostei do lugar ter rodízio de fondue. Detesto cheiro de fritura, então perto do fim o negócio já estava insuportável.
De volta ao calçadão, era hora de ligar para a pousada para solicitar o traslado. A essa altura o termômetro já marcava 6°. O problema nem é a temperatura em si, mas o danadinho do vento. E o ponto marcado para esperar o traslado é bem servido no quesito. Resultado: aí sim o frio arrochou. Hora de me virar com o casaco que está mais para jaqueta. Nem esperamos tanto, mas o vento fazia cada minuto virar uma eternidade. A van também estava um gelo, porém nada que chegasse perto da Kombi de Seu Coelho em Gramado, um verdadeiro freezer de rodas. Mas a lembrança já foi divertida.
De volta à pousada, tudo já estava bem quentinho com todos os aquecedores ligados. Finalmente eu iria dormir depois de mais de 24 horas no ar. O que fazer em Campos do Jordão no dia seguinte eu só iria pensar no dia seguinte. E esse relato fica para a próxima postagem.