Não é nada fácil fazer e manter um elenco de qualidade no futebol nordestino, especialmente para clubes que não sejam de PE e da BA. Faltam patrocínios de peso, cotas de televisão de vergonha e, fundamentalmente, faltam torcedores. Melhor: faltam torcedores no estádio.
Segundo pesquisas, no RN, ABC e América estão perto do milhão de torcedores. Mas as duas partidas das finais entre os dois no ano em que ambos completam 100 de anos de existência não somaram 30 mil espectadores nos estádios. Aí assistimos no mesmo dia da última partida pela TV a Ceará e Fortaleza colocarem 50 mil pessoas em apenas uma partida da final. E olha que a torcida do Ceará já havia colocado 63 mil pessoas na quarta-feira da mesma semana na final da Copa do Nordeste.
Qual seria o problema do RN: crise, ingressos mais caros, associação com preço alto, violência das torcidas? Não sei dizer. Só sei que guardo uma certeza dentro de mim: o povo do RN não gosta dos clubes daqui. Esporadicamente, vemos exemplos contrários, como a final entre América e Globo no estadual do ano passado com mais de 20 mil pessoas no estádio, ou mesmo em 1998, quando mais de 40 mil americanos viram o América se tornar campeão do nordeste contra um super Vitória, com Petkovic e cia. O público normal de um jogo no RN não passa de 4 mil pessoas. O mesmo se diga do número de sócios, tanto de ABC como de América: se conseguirem 3 mil, já devem soltar rojões.
Não quero discutir preço de ingresso ou mensalidade de sócio, nem mesmo quais benefícios são ou deveriam ser dados a quem se associa a América e/ou ABC. Falo mesmo é da quantidade de motivos alegados para relegar os pobres clubes do RN a um segundo plano. São os mais variados: desde diretoria mercenária à falta de mais benefícios, além dos ingressos. Cresci numa época em que ser natalense era ser sócio ou do América, ou do ABC, ou do Alecrim. Pagava-se caro por um título patrimonial e ainda havia taxa mensal. Benefício? Só acesso às piscinas do clube, mesmo assim de forma limitada.
Desde que foi criado o tal sócio torcedor, em geral, paga-se um valor mensal e o adquirente passa a ter direito de assistir a todos os jogos do clube em questão sempre que este detenha o mando de campo. Há vários outros benefícios, como descontos em produtos que vão de cerveja a botijão de gás. Para mim, tudo isso sempre foi mero detalhe. Sou sócia porque tenho orgulho de fazer parte do meu clube. No caso do América, meu pai era sócio proprietário. E eu comecei a minha história de contribuições mensais ao meu time de coração numa situação penosa como a atual: um rebaixamento para a Série C, conjugado a uma crise financeira e administrativa que ameaçava até mesmo a continuidade do clube no futebol brasileiro. Lembro bem que naquele ano (2005), Augusto Varela convocou torcedores apaixonados para uma reunião na sede social e lá apresentou a ideia de um carnê com prestações mensais no valor de R$ 10 para que a torcida fosse o grande patrocinador do Mecão. Muita gente pegou mais de um carnê. Benefícios? Nenhum, a não ser um adesivo que Augusto mandara fazer e distribuíra ali mesmo com os presentes, independentemente de eles aceitarem ou não o pagamento dos carnês.
10 anos depois, eu vejo discussões sobre quais as vantagens de ser sócio dos clubes daqui e fico pasmada. Não compreendo. Ou se é de um clube, ou não. Ou se abraça um clube por amor, ou não. Ser sócio só tem uma vantagem para gente como eu: o orgulho de fazer parte do meu clube de coração. Receber acesso prático a todos os jogos e ainda ter um planejamento mensal a respeito de quanto será gasto com o futebol é mais do que benefício, é uma benção. Ah, mas há muita gente que não pode pagar uma mensalidade ou um ingresso de R$ 50. Coloca um jogo do Flamengo a R$ 100 aqui para ver se a Arena não fica entupida de gente! Além disso, há outros planos mais em conta.
Dói, mas o torcedor potiguar gosta mesmo é de torcer pelos clubes da televisão, principalmente os do Rio de Janeiro. Torcer por América e ABC está mais para uma leve simpatia só lembrada em época de grandes jogos contra os times do eixo RJ-SP. No restante do tempo, que importa se os bravos representantes do povo potiguar no futebol morrerão de inanição?
Sobre o título deste texto eu me posiciono agora. Entre ter craques (talvez seja melhor trocar por bons jogadores) no time ou manter as contas do clube em dia, eu sou 100% a favor da última opção. E nem me venham com aquele papo de "traz o craque que a torcida paga". Tudo balela. O América fez um timaço para o estadual, time que teria até condições de brigar para ficar na Série B do Brasileirão, e só não está endividado (ainda) porque houve sobra de caixa do ano passado, segundo as palavras do presidente agora licenciado Gustavo Carvalho. Tanto é assim que a saída de jogadores começou faz tempo. Wálber, titular, foi embora. Daniel Costa também não vai ficar, segundo o Vermelho de Paixão, O próximo da lista, podem anotar, é Max. Afora outros mais que não eram titulares, mas que aparentemente não terão reposição pelas terríveis perspectivas financeiras do clube, que não renovou com a Caixa (pelo menos até agora).
Enquanto isso, a lista de motivos para não ser sócio só aumenta, assim como a de reclamações dos torcedores. Já a lista dos que abraçaram o clube e querem empurrá-lo de volta à Série B essa nem chegou aos 2 mil...
Pobre futebol potiguar, sempre inferiorizado e preterido em razão de qualquer coisa que venha com a marca NOT MADE IN RIO GRANDE DO NORTE.