Como previsto desde que o primeiro turno da eleição presidencial começou a se desenhar, o Brasil sai ainda mais dividido pós-voto.
A exemplo de eleições anteriores, o presidente ungido pelas urnas não obteve o maior número de votos dentre os eleitores.
Numa população de mais de 209 milhões, o eleitorado já se resume a 147 milhões em números arredondados. Destes, 31 milhões, ou 21% do eleitorado, não se deram nem ao trabalho de comparecer às seções eleitorais. Outros 11 milhões, ou quase 10% do eleitorado, anularam o voto ou votaram em branco. Isso já reduz o número de brasileiros que efetivamente escolheu o destino do país: 104 milhões - menos da metade da população brasileira.
Desses que efetivamente votaram, o presidente foi escolhido por quase 58 milhões. Seu adversário obteve 47 milhões de votos. Ou seja, para onde quer que olhemos, o sistema eleitoral brasileiro não consegue mais dar legitimidade aos presidentes eleitos, posto que eles não conseguem mais apoio de parte expressiva da população, relegados que estão a 25% do apoio dos que têm este país tropical como lar. E olha que no Brasil o voto é obrigatório e o 2.° turno foi criado justamente para que um dos candidatos enfim consiga legitimidade.
A nação brasileira precisa ser chamada à sua responsabilidade. Se não temos o país que queremos, os governantes que queremos e os políticos que queremos, a culpa é majoritariamente nossa. Quantos de nós de fato acompanham o que se passa em Brasília ou mesmo na cidade em que moram? Quantos acompanham o importante trabalho legislativo para saber o que está em discussão e até para pressionar o representante escolhido em votações importantes?
Quantos de nós somos capazes de apontar o posicionamento de políticos e sua vida pregressa a uma candidatura para um cargo no executivo?
Quantos de nós "perdemos tempo" lendo jornais, revistas e prestando atenção em reportagens em rádios e TVs que digam respeito à atividade política, ou mesmo sobre a economia do Brasil, dos estados e das cidades?
Quantos leem obras que se propõem a explicar o passado e o presente do Brasil e do mundo e a projetar um futuro a partir das decisões hoje tomadas?
Quantos leem uma obra literária - qualquer uma - para expandir seu conhecimento de mundo?
Quantos de nós acreditam piamente nas correntes, outrora de e-mail, agora de WhatsApp?
Num ambiente assim, votar seguirá por muito tempo um fardo para parte expressiva da população e seguiremos com presidentes marcados pela falta de legitimidade adequada e governos como equilibristas numa eterna corda bamba.
Tendo agora o Brasil escolhido um projeto claramente autoritário e sem que se tenha discutido amiúde as propostas que ele traz, é hora do povo brasileiro começar a se interessar pelo que ocorre em Brasília e que se reflete em todo lugar. É hora de gostar de ler, de acompanhar noticiários, de se inteirar do que o Congresso anda votando e tentar finalmente conhecer o que pretende o próximo presidente.
Mais: é hora de conhecer e se apaixonar por nossa Constituição.
É assim que fortalecemos uma combalida democracia e impedimos que maus políticos nos iludam a cada eleição para nos desiludir ainda no primeiro ano pós-voto, transformando a governabilidade em inferno e nossas vidas em verdadeiro martírio.
Depende de nós evoluirmos como nação. Quantos de nós estamos dispostos a assumir essa responsabilidade?